Eles foram duramente atacados nos últimos quatro anos pela administração Trump, que vinha travando batalhas na justiça tentando, a todo custo, acabar com o DACA, o programa criado pelo ex-presidente Barack Obama que protege da deportação os estudantes que foram trazidos ilegalmente para os Estados Unidos ainda criança. Mais de 650 mil imigrantes se encontram nesta situação, muitos deles brasileiros que receberam com alívio e esperança de mudança de atitude a vitória do democrata Joe Biden.
Luana Rodrigues dos Santos, residente de Boston, MA, chegou aos EUA com a mãe quando tinha 4 anos. Desde cedo ela aprendeu a manter uma vida reservada para não despertar a atenção. O futuro não parecia ser promissor para uma menina vinda de outro país e vivendo sem documentos. A reviravolta aconteceu em 2012, quando o então presidente Obama criou o DACA após uma tentativa frustrada de alterar o sistema imigratório para legalizar milhões de pessoas. Assim como milhares de imigrantes, Luana respirou aliviada e passou a focar nos estudos.
Em 2017 o presidente Donald Trump tentou, pela primeira vez, acabar com o DACA, mas foi barrado por um juiz federal. Novas tentativas se seguiram ao longo dos anos causando preocupação e uma série de protestos dos chamados “dreamers” e de defensores dos direitos dos imigrantes ao redor do país. “Nos últimos anos com Trump, nós nunca sabíamos o que ia acontecer amanhã. Era uma preocupação constante. Com Biden isso vai acabar”, disse Luana.
Hoje, aos 21 anos e cursando o último semestre em neurociência na Universidade de Massachusetts, Luana acredita que poderá concentrar nos estudos e na carreira.
Durante a campanha, Biden prometeu restabelecer o DACA e abrir a porta para uma futura legalização, uma das principais reivindicações dos imigrantes que fazem parte do programa. Felipe Lima, 31, residente da Flórida e que chegou aos 11 anos do Brasil, fez campanha e comemorou a eleição de Biden. A vitória representa para ele a mudança de atitude quanto aos imigrantes do DACA. Ele também vê a possibilidade de sair do país, sem correr o risco de ser impedido de voltar, uma realidade futura, assim como a oportunidade de obtenção do seguro de saúde. “As duas coisas mais importantes agora é poder ter o ObamaCare e ir ao Brasil visitar meus parentes”, disse.
Desafios do novo governo
A vitória de Biden traz esperanças, mas também dúvidas quanto às chances do novo governo em aprovar novas políticas caso o senado se mantenha sob o controle dos republicanos. Com uma disputa acirradas, e até o momento indefinida, analistas dizem que sem a maioria o governo terá que negociar com os senadores da oposição para aprovar temas polêmicos, como imigração e seguro de saúde.
Apesar de mencionar diversas vezes durante a campanha que irá lutar pela reforma do sistema imigratório e legalizar milhões de imigrantes que já vivem no país, a imigração nem sequer aparece no seu website destinado à transição, que coloca Covid-19, recuperação econômica, justiça racial e mudança climática como prioridades.
Luana vê com pessimismo a realização de uma mudança radical e rápida feita pelo novo presidente. Ela acredita que as mudanças realizadas por Trump irão criar dificuldades para o próximo governo caso queira mudar as leis. “Eu não penso que Biden conseguirá aprovar alguma mudança dramática sem maioria no senado”, acredita. Ela, no entanto, diz que o fato de não correr risco de perder o que já tem foi uma vitória.
Advogados de imigração também não esperam que haverá facilidades para o novo governo e que alterar as leis através da emissão de ordem executiva não resolverá o problema permanentemente. “O ideal é que o Congresso passe leis protegendo os dreamers, estabelecendo um caminho para a legalização permanente”, avalia a advogada Emilia Banuelos.
Ira Mehlman, da Federação para Reforma da Imigração Americana, tem avaliação semelhante. “Se a administração Biden quiser fazer algo desta natureza eles terão que negociar muitas coisas que os republicanos querem para assegurar que não estaremos na mesma situação em alguns anos”, diz.
Felipe compartilha dos mesmos questionamentos, mas prefere acreditar que o futuro é mais promissor do que a realidade de medo que hoje vivem os imigrantes do DACA. “Eu tenho plena convicção que Biden irá abrir um caminho para a nossa legalização e que possamos no futuro fazer a cidadania”, disse.