Um amigo fez curso de enologia e certa vez me explicou que cada uva produz vinhos com sabores e características diferentes, e que é possível distinguir uns dos outros com certa facilidade. Um dia foi jantar na casa de meu irmão, pegamos uma garrafa de vinho caríssimo que outro amigo da Califórnia nos deu para abrir no jantar. Mostrei a ele e ficou todo entusiasmado em poder provar um vinho que dificilmente seria encontrado por aqui. Levei para a cozinha e abri a garrafa – mas coloquei no copo dele um legítimo Sangue de Boi. Ele pegou o copo, revolveu circularmente para arejar, deu uma fungada e bebeu um gole. Descreveu os aromas e características como se fosse algo de outro mundo. Não preciso dizer que ele ficou um pouco sem graça depois que mostrei o vinho que bebeu, mas todos demos risada, inclusive ele. Respondeu que mesmo Sangue de Boi pode ser bom – não chega a ser intragável, mas não é bom como um vinho com “pedigree”…. Não que ele não entenda de vinhos, garanto que isso poderia ter se passado com muito connoisseur do assunto, e todos iriam reagir da mesma forma com uma pegadinha dessas (e negar depois, hehehe).
Eu mesmo não entendo blicas de vinhos, acabo repetindo as marcas dos que gosto e experimento um novo de vez em quando, mas não tenho coragem de pagar uma fortuna por uma garrafa. Tem vinhos muito bons na faixa de 30-40 reais vendidos aqui no Brasil e nem vejo necessidade de pagar mais. Sempre digo que depois da segunda ou terceira taça tanto faz–só não compro vinhos muito baratos, a menos que venham com remédio para dor de cabeça junto. Sei que há vinhos brasileiros considerados muito bons, mas esses custam bem mais que os chilenos ou argentinos e não são tão facilmente encontrados em supermercados – já os mais baratos só servem para fazer sagú. (hum… adoro sagú com vinho!)
Mesmo comprando vinhos mais econômicos, tenho alguns preconceitos. Não gosto de comprar vinho com tampa de rosca ou com rolha sintética – acho que um mínimo de ritual deve ser seguido. Obviamente que tem algumas marcas que usam tampa de rosca que produzem vinhos bons, mas que tal colocar este líquido precioso em um recipiente adequado? Os defensores dessas pseudo-rolhas dizem que os sobreiros (árvores que produzem cortiça) estão ameaçados. Bullshit, Portugal fornece cortiça ao mundo há séculos, e a árvore regenera sua casca com a espessura adequada a cada 9 ou 10 anos. Sem falar que a produção de cortiça emprega milhares de pessoas e representa mais de 3% do PIB do país (chega de dados da Wikipédia).
Agora, se acho que rolha sintética já não é adequada, imagine o que penso de vinho em embalagem longa vida? Ou pior ainda, vendido em sacos plásticos dentro de caixas de papelão? Vi pela primeira vez na Nova Zelândia, como assim, “saco plástico?!? Pensei na cena de um jantar fino, e o garçom enchendo os copos com um saco plástico… dizem que a embalagem desta forma barateia o custo final e seria para quem consome no dia a dia em casa. Com a globalização é possível achar vinhos muito bons importados por preços acessíveis em qualquer supermercado, o que eles querem? Pagar um dólar por litro?
Ele poderiam responder da mesma forma que escrevi acima–que depois do terceiro copo tanto faz. Pelo menos no meu primeiro copo vejo o vinho saindo de uma garrafa decente…