Ouvir algumas das canções que marcaram a curta, porém intensa, passagem de Elis Regina pelo planeta Terra foi uma deliciosa volta ao passado. A cantora carioca Rose Max procurou entremear sua interpretação das músicas com histórias vividas por Elis e por ela própria a fim de situar a maior cantora da MPB do século XX.
O show no American Rock Pub no último sábado (17), em Deerfield Beach, foi aberto com Arrastão, clássico de Vinicius de Moraes e Edu Lobo que catapultou a carreira da então jovem cantora nascida em Porto Alegre em 17 de março de 1945 (ou seja, o espetáculo homenageou a data em que a “Pimentinha” completaria 73 anos se estivesse viva). Na sequência, Águas de Março de Tom Jobim, Trem Azul de Lô Borges e Mestre Sala dos Mares, da dupla Aldir Blanc e João Bosco (um dos artistas revelados por Elis). Depois de Me Deixa em Paz de Ronaldo Monteiro de Souza e Ivan Lins (outra revelação que os brasileiros conheceram graças à Elis), outro clássico da dupla Blanc e Bosco: Dois Pra Lá, Dois Pra Cá. Casa no Campo, de Zé Rodrix e Tavito, levou o público ao delírio que se animouainda mais com Quem Riu Fui Eu, de Baden Powell. A intimista Atrás da Porta, de Chico Buarque de Holanda, deu o tom para os espectadores prestarem atenção na letra singular do talentoso compositor. É Com Esse Que Eu Vou, de Pedro Caetano, também fez o povo cantar e o público vibrou com Nada Será Como Antes, de Milton Nascimento e Fernando Brant (outra descoberta de Elis para a MPB). Rose Max interpretou lindamente Basta de Clamares Inocência do mestre Cartola e fechou o primeiro ato em grande estilo com Madalena de Ivan Lins e Monteiro de Souza.
No intervalo, Carlos Salles da Brazilian Party Productions & Entertainment, produtor da série Resgatando Pérolas da MPB, aproveitou para divulgar os patrocinadores e sorteou alguns prêmios para aqueles que preencheram uma ficha sugerindo novos nomes que merecem ter seus tributos, a exemplo deste feito para Elis Regina.
O Bêbado e a Equilibrista, de Aldir Blanc e João Bosco, me remeteu aos tempos lúgubres da ditadura, pois a letra exalta a luta de brasileiros caídos na luta pela democracia. Fiquei em dúvida se a maioria do público captou a mensagem contida na letra cortante de Blanc. O clássico country de Renato Teixeira levantou as pessoas que cantaram em bom som a letra pungente do autor que sabe como poucos cantar a alma interiorana. Pra Lennon e McCartney, de Fernando Brant e Milton Nascimento, não poderia mesmo faltar, assim como Corsário, de Blanc e Bosco. Upa Neguinho, de Edu Lobo, também mexeu com o público, mas foi Como Nossos Pais, de Belchior, que fez todos cantar a plenos pulmões. Fascinação, de Marchetti e Feraudy, com tradução de Armando Louzada, enlevou o público. Tiro ao Álvaro, de Adoniran Barbosa, e Alô Alô Marciano, de Rita Lee, mostrou compositores paulistas, enquanto pout pourri Aquarela do Brasil/Nega do Cabelo Duro/Querelas do Brasil preparou o público para o clássico Carinhoso, de Pixinguinha. Para encerrar o show, só mesmo a contagiante Maria, Maria, da dupla Fernando Brant e Milton Nascimento. A área reservada do bar americano transformou-se em um autêntico clima de Brasil com música tomando conta do local e a própria Rose Max foi sambar com a galera.
A ideia de Carlos Salles de homenagear os grandes nomes da MPB é excelente. A escolha de Rose Max e Ramatis Moraes também foi ótima, porém, não dá para deixar de criticar a péssima acústica do local. Claro que, por ser um bar, não há preocupação dos proprietários em investir nisto. Carlinhos deve ter feito um bom acordo com os donos do bar – cujo principal interesse é vender comidas e bebidas -, porém, deve avaliar se este é realmente o melhor lugar para realizar um show desta categoria.
Para finalizar, lembro de meus tempos de repórter quando fui designado para cobrir o enterro de Elis Regina no Cemitério do Morumbi, em São Paulo. Triste, por ser grande fã de Elis, pude constatar que o povo amava a “Pimentinha”, pois ela sempre foi considerada uma cantora de elite. Que nada, era popular. E fantástica! Pena nos ter deixado aos 36 anos, vítima de uma overdose de cocaína – a comprovar que as drogas sempre nos privam de grandes talentos. Basta lembrar de Janis Joplin, Jimmy Hendrix, Kurt Cobain, Whitney Houston, Amy Winehouse, Dolores O’Riordan entre outros.