DA REDAÇÃO, COM G1 – Uma quadrilha transformou dezenas de imigrantes sírios em cidadãos brasileiros – com certidão de nascimento, identidade, título de eleitor e passaporte. Após oito meses de investigação, a polícia identificou 72 sírios envolvidos na fraude. Duas pessoas foram presas e outras duas respondem em liberdade por falsidade ideológica e associação criminosa.
Durante as investigações, os policiais chegaram a um endereço na Zona Norte do Rio, onde vivia Ali Kamel Issmael. Ele é sírio e tem visto permanente para morar no Brasil. Aos 71 anos, ele não chamava atenção, mas era o homem que arquitetava toda a falsificação.
A polícia identificou também a mulher dele, Basema Alasmar. Policiais dizem que Ali Kamel Issmael era o anfitrião de grupos que vinham da Síria e de outras partes do mundo. Antes da mudança de nacionalidade, ele oferecia uma espécie de pacote de turismo, com direito a passeios pela cidade e tradução.
Depois vinham os negócios, que começavam em um cartório de registro na Zona Oeste da cidade. Com a ajuda de um funcionário e um ex-funcionário, os sírios tinham a certidão de nascimento falsificada e se transformavam em cidadãos brasileiros. Mesmo sem falar português, conseguiam todos os benefícios que os brasileiros nativos e naturalizados têm.
A investigação mostrou que a fraude acontecia nos livros de registros de nascimento. Uma perícia revelou que foi um trabalho grosseiro, com folhas soltas, rasuradas, adulteradas e até coladas.
Visto para os EUA
Atendendo a um pedido da polícia, o Consulado Americano no Rio de Janeiro informou que 17 sírios com documentos brasileiros feitos a partir da fraude pediram visto para entrar nos Estados Unidos. Desses, cinco fizeram o pedido com o passaporte brasileiro.
Dois são ex-militares das forças armadas da Síria. O governo dos Estados Unidos avisou que se eles apresentarem documentos brasileiros em território americano vão para a cadeia.
Os investigadores afirmam que as fraudes aconteceram entre 2012 e 2014. Eles dizem que Jorge Luiz da Silva, o funcionário do cartório, arrancava as folhas dos livros e levava para David dos Santos Guido, ex-funcionário do cartório que foi demitido depois de outra investigação de fraude. Ele fazia o registro dos sírios como brasileiros em casa. Depois, Jorge recolocava as folhas no lugar.
“Eles arrancavam as folhas dos livros cartorários, são mais de 4 mil livros cartorários, arrancavam aquelas folhas originais, e o funcionário enxertava a nova folha numa certidão de nascimento naquele livro cartorário. Ou seja, deixava de existir um brasileiro nato, ou naturalizado, para dar origem a um sírio supostamente brasileiro”, disse o delegado da Delegacia de Defraudações, Aloysio Falcão.
A dupla nem se preocupou com a escolha das informações que eram registradas. Todos os sírios se tornaram brasileiros com certidões feitas bem depois do dia do nascimento. São os chamados registros tardios. Pelo que está nos documentos, todos nasceram dentro de casa, nunca em hospitais. Os endereços são sempre os mesmos também.
As suspeitas só começaram a aparecer quando um funcionário do Detran desconfiou das certidões de nascimento que tinham informações muito parecidas. Ele avisou à delegacia que investiga fraudes e os policiais descobriram que os sírios não queriam se passar por brasileiros apenas no Brasil. Pelo menos 20 deles tiraram o passaporte brasileiro. O que ninguém sabe até agora é onde esses sírios estão hoje.