Histórico

Pesquisador analisa o sistema eleitoral americano e diz que Flórida vai decidir as eleições

Professor e pesquisador da Lynn University, Robert P. Watson fala com exclusividade ao AcheiUSA e explica o complexo processo eleitoral americano

Joselina Reis

O professor e pesquisador Robert P. Watson garante que muita coisa está em jogo na eleição americana do dia 6 de novembro. Nunca, na sua opinião, os dois partidos, Republicano e Democrata, se posicionaram de maneira tão diferente. Watson, que também é comentarista político, estudou todas as eleições presidenciais americanas dos últimos 200 anos. Hoje, ele é diretor de Departamento de Estudos Americanos na Lynn University. A instituição ganhou fama nacional no dia 22 de outubro ao abrir as portas para o último debate entre Barack Obama e Mitt Romney.

Watson recebeu a equipe do jornal AcheiUSA e explicou como a eleição americana é mais complexa que a brasileira e porque o voto popular conta, mesmo que quem realmente eleja o presidente dos Estados Unidos seja um grupo de 538 pessoas. Segundo ele, na hora da decisão, a Flórida é o estado mais importante do país, principalmente devido ao intenso número de votos latinos. Na última, pesquisa nacional confiável, Obama tem 69% entre os latinos e Romney 21%, mas na Flórida a diferença é menor, por causa da presença dos cubanos. Eles preferem os republicanos porque o partido tem planos mais rigorosos contra Fidel Castro.

Acompanhe a entrevista do professor Watson ao AcheiUSA.

AcheiUSA – Qual a diferença entre republicanos e democratas?
Robert Watson – Todo mundo diz que não existe diferença entre os dois partidos e que o povo sempre vai acabar levando a pior, porém há diferenças históricas. No começo, o presidente do país até mesmo trocava de partido constantemente, mas isso mudou entre 1901 e 1909 quando os dois partidos realmente se separaram e mostraram suas linhas de oposição. Hoje, a diferença entre os dois é significativa e é quase impossível achar alguma coisa em comum entre republicanos e democratas. Por exemplo: os democratas querem a criação de um salário mínimo; financiamento estudantil por parte do governo; defendem um sistema público de saúde e creem que o governo deveria investir dinheiro em pesquisas públicas como a de células tronco. Já os republicanos querem que o mercado estipule o valor do salário mínimo; que os bancos privados ofereçam o financiamento estudantil e querem deixar nas mãos das seguradoras o controle dos planos de saúde.
No entanto, atualmente a diferença entre os dois tem sido ainda maior. Há também a questão do aborto, onde democratas são a favor, republicanos contra; a legalização de armas democratas são contra e republicanos a favor; pena de morte republicanos querem manter enquanto os democratas são contra; Cuba republicanos querem restringir as relações com a ilha de Fidel e democratas querem estreitar a amizade com o país vizinho; e o grande debate sobre imigração democratas querem a reforma imigratória e os republicanos se opõem a uma reforma imigratória

AU – Qual a diferença entre eleitores e colégio eleitoral?
RW – O voto popular é simples quando o povo vota em um ou outro candidato e a somatória elege o presidente. Nós, americanos, elegemos senadores, governadores, prefeitos e outros, porém tecnicamente não elegemos o nosso presidente. Nós elegemos o presidente com base no colégio eleitoral. Isso funciona da seguinte maneira: cada estado tem um número de membros no colégio eleitoral, o montante depende de quantos senadores e representantes federais cada estado tem. A Flórida tem 27 representantes federais e dois senadores, portanto o nosso colégio eleitoral é formado por 29 membros. Depois de apurados o voto do povo, esses membros endossam o candidato escolhido pelos eleitores. O ganhador pelo voto popular ganha os 29 votos do colégio eleitoral. O ganhador leva todos os 29 votos. Para ser presidente, o ganhador precisa de pelo menos 270 votos dos 538 votos do colégio eleitoral nacional. Por isso, mesmo que o voto popular não eleja o presidente, cada voto conta sim.
A Flórida é o estado mais importante dos Estados Unidos em uma eleição presidencial. Isso se dá por dois motivos: primeiro somos o quarto maior estado do País, sendo que os três primeiros já têm sua posição bem definida (um republicano e dois democratas). A Flórida sempre pode mudar tudo no último minuto; segundo a Flórida é considerada um termômetro. Para onde a Flórida vai, os outros estados seguem. Nós temos concentração de grandes grupos de latinos, afroamericanos, judeus, idosos e veteranos. Nós somos um exemplo demográfico do país inteiro. Desde 1960, todo presidente que ganha na Flórida ganha a Casa Branca, somente no caso de Bill Clinton houve uma reviravolta.

AU – Por que o eleitor não escolhe o presidente, mas, sim, o colégio eleitoral?
RW – No dia da eleição, nós vamos às urnas, mas nosso voto não vai diretamente para o candidato. Cada estado toma conhecimento do que o povo quer e, em dezembro, os membros do colégio eleitoral (Flórida tem 29) se reúnem na capital do estado, e aí sim eles votam em um nome para presidente. Eles votam em bloco. Em minha opinião, isso é loucura. Na maioria das vezes, eles votam de acordo com o que o povo colocou nas urnas, mas, por lei, eles votam em quem eles quiserem e o povo não pode fazer nada. Há casos na história quando o colégio eleitoral resolveu em prol do vice-candidato ao invés do candidato principal, em outras ocasiões o colégio eleitoral não respeitou a escolha popular e elegeu o candidato derrotado nas urnas. Mas hoje, por causa da mídia, eu aposto 99% que o colégio eleitoral vai seguir o que povo colocar nas urnas no dia 6 de novembro. Desde 1789 já houve aproximadamente 740 tentativas de mudar esse sistema de colégio eleitoral aqui nos Estados Unidos, todos falharam porque os dois partidos não querem que outros partidos entrem na corrida presidencial e porque o povo não entende o sistema. Se o povo entendesse já teriam mudado esse sistema. No final das contas, nós estamos nas mãos deles.

AU – Você acha que deveria ter mais partidos políticos nos Estados Unidos?
RW – Sim. Deveríamos ter mais partidos. Quanto mais partidos e mais opções, melhor. Nós tivemos outros partidos, mas somente uma vez na história, em 1912, um terceiro partido marcou presença na corrida presidencial batendo os republicanos, mas mesmo assim não elegeu seu candidato. Hoje, nós temos outros pequenos partidos, mas eles não são fortes. Para se ter uma ideia, atualmente há apenas dois senadores independentes, mas um nem vai tentar a reeleição.

AU – Por que o imigrante deveria votar?
RW – Eleição tem um grande impacto na vida do imigrante. Se você não votar você estará abandonando o seu direito criado pela constituição americana. Democracia não funciona se o povo não tomar controle do governo. No nosso sistema, cada indivíduo tem o seu direito a voto, mas o povo esquece que tem deveres também. E o dever de todo mundo é manter-se informado do que acontece com seu país. Se você não vota não tem direito de reclamar dos resultados. Mas nessa eleição, especialmente em 2012, a diferença apresentada nas pesquisas pelos dois candidatos é tão pequena, que o destino do país pode ser decidido por um estado, por algumas centenas de votos, ou pode ser decidido por um ou dois condados. As divergências ideológicas entre os dois são grandes e estão ficando maiores. Esta eleição é importante. Cada voto conta, sim. Ainda temos soldados no Afeganistão, temos um problema imigratório para resolver e temos uma dívida crescente.

AU – Você acha que a cédula de votação este ano está muito longa e complicada?
RW – Sim. Nós temos quase uma dúzia de emendas para votar desta vez. O que faz com que essa eleição seja a mais longa e complicada dos últimos tempos. Por isso, eu criei um guia simplificado para ajudar o eleitor este ano. O eleitor despreparado pode levar mais de trinta minutos para ler aquele papel. Todas as emendas constantes nessa cédula são referências estaduais.

AU – O que você acha das eleições 2012?
RW – As eleições 2012 serão umas das mais intrigantes, apertadas, interessantes e importantes da história. Nós chegamos a uma encruzilhada na história americana, o eleitor tem duas visões políticas dramaticamente diferentes entre Obama e Romney para escolher. O resultado dessa eleição é muito importante!

AU – Como o problema do voto em bloco no senado pode ser resolvido?
RW – Para mudar, somente alterando a constituição. No papel, se 51% dos cem senadores votar a favor de um projeto isso passa, mas na prática não é assim que acontece. Romney reclamou que Obama esteve por quatro anos no poder e não passou algumas leis, mas não foi possível por causa do uso da votação em bloco. A melhor maneira de resolver isso é levar mais gente às urnas, não interessa para quem você vote, apenas vote! A população precisa ser mais participativa, ligar para os representantes e reclamar. Nós temos que tomar mais controle do governo. Todo político quer ser reeleito e eles vão ter que ouvir o povo. Se todos querem uma coisa, eles terão de oferecer.

AU – O que achou do último debate?
RW – Romney ganhou o primeiro, Barack Obama ganhou o segundo e no último Obama ganhou por pouco. Mitt Romney muda sua posição a cada debate. Ele falava uma coisa quando era governador, depois outra quando corria atrás da nomeação do partido e agora fala outra. Mas isso é muito comum e histórico. Eles sempre mudam de acordo com o que precisam até conseguir a aprovação da maioria e serem eleitos. O mesmo acontece com os democratas. Eles querem fazer todo mundo feliz, por isso ora são de esquerda, ora de direita e acabam no meio, assim conseguem o que quer. Todo candidato faz isso. Mas no caso de Mitt Romney ele tem feito isso mais do que qualquer político que eu me lembre e olha que eu tenho estudado todas as eleições desde o século 18. Nunca vi nada parecido. Romney já foi a favor do aborto, depois contra, já foi a favor do plano de saúde e agora voltou atrás. Já foi a favor do controle de armas, agora é contra. Ele muda muito. Nós não podemos saber o que esperar dele, se eleito. Tudo pode mudar.

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