Miltinho era o melhor preparador de caipirinha da churrascaria. Ocupava um dos postos mais inferiores da casa, abaixo dos cozinheiros, churrasqueiros e passadores de carne, mas era famoso pela caipirinha. Passeava entre as mesas com seu carrinho de bebidas oferecendo a especialidade, preparada na frente do cliente, no capricho. Tratava todo mundo por ‘meu comandante’, e tinha uma simpatia natural e séria, que não precisava de esforço ou bajulação para transparecer.
Os sócios da churrascaria não se entendiam, e não demorou muito a casa fechou, deixando no olho da rua os funcionários, incluindo Miltinho, que sumiu de cena. Meses depois ele reapareceu em outra churrascaria, em Fort Lauderdale, onde reassumiu o comando do carrinho de bebidas e na produção das famosas caipirinhas.
Entre os muitos ‘comandantes’ que Miltinho servia estava um francês, apaixonado por churrasco e caipirinha, que comparecia sempre à churrascaria quando estava na Flórida. Fazia questão de ser servido pelo Miltinho, e muito embora o garçom mal falasse inglês, e muito menos francês, os dois se entendiam às mil maravilhas. Assim passaram os anos, com o francês curtindo o churrasco brasileiro e as caipirinhas do Miltinho toda vez que vinha para Fort Lauderdale.
Não se sabe bem ao certo como foi que se entenderam mais profundamente, mas um dia o francês quis saber o que era preciso para abrir uma churrascaria. Miltinho não sabia, mas consultou o churrasqueiro da casa, seu amigo desde o tempo do outro restaurante. O churrasqueiro sabia de tudo, só o que faltava era o essencial: o capital.
– Isso não é problema – disse o francês, e perguntou de quanto precisavam.
Dono de uma fábrica de biscoitos na França e milionário, o francês não viu problema em emprestar a quantia para os dois montarem sua própria churrascaria. Confiava na simpatia natural do Miltinho, no capricho que ele demonstrava na confecção de caipirinhas, na competência do amigo churrasqueiro e na sua intuição de homem de negócios para o sucesso da empreitada. Resolveu apostar. Miltinho quase caiu para trás quando um dia o milionário mostrou um cheque com a quantia necessária.
– Paguem-me quando puderem – disse o francês.
De comandados, Miltinho e o churrasqueiro passaram a comandantes. Encontraram uma casa perfeita para a nova churrascaria e se estabeleceram. Com a experiência adquirida nos longos anos trabalhando para ‘comandantes’ e a fama que tinham entre a clientela, logo Miltinho e o churrasqueiro fizeram da casa um sucesso. Orgulhoso e feliz, o francês frequentava uma mesa cativa na nova churrascaria, servido agora pelo seu próprio sócio. A aposta tinha dado certo.
Um par de anos depois, enquanto o francês mais uma vez se deliciava com carnes e caipirinha, Miltinho apareceu com um cheque. Era a quantia exata que o francês lhe tinha emprestado.
– Mas meu comandante pode comer aqui de graça sempre que quiser – disse Miltinho.
– De jeito nehum, faço questão de pagar como qualquer cliente – retrucou o francês – Negócios são negócios.
O que ele ainda não sabia é que Miltinho não só tinha conseguido com a churrascaria o dinheiro para pagar o empréstimo como também ganhara o suficiente para abrir uma filial da casa.
– Graças ao meu comandante – disse Miltinho, o rei das caipirinhas.