Restos mortais de 181 imigrantes foram encontrados no deserto do Arizona entre janeiro e setembro de 2020. Número que representa 37 mortes a mais que todo o ano de 2019, segundo um levantamento feito pela Humane Borders , organização que atua na defesa dos direitos humanos.
A quantidade de mortes deste ano também é a maior desde 2013, quando foram encontrados 186 corpos de imigrantes no deserto.
Grupos humanitários e autoridades públicas do condado de Pima, no Arizona, relacionam o alto índice de mortes ao endurecimento das políticas de segurança na fronteira, que leva os imigrantes a driblarem a fiscalização buscando rotas mais arriscadas para entrarem nos EUA.
“É como parar a água: se você bloqueia em um lugar, ele irá para outro lugar”, disse o xerife de Pima county, Mark Napier. “Estamos vendo os resultados disso como aumento nas mortes”, completou.
Segundo a Humane Borders, 85 óbitos foram registrados apenas nos últimos três meses deste ano. Para chegar a esses números, a instituição usou dados do Pima County Medical Examiner’s Office e de outras instituições públicas.
“Jornada para a morte“
Em entrevista ao jornal Arizona Times, o xerife Mark Napier disse que as mortes são quase 100% provocadas pelo calor intenso associado à falta dàgua. “Se você está caminhando 20 milhas no deserto, sob um calor de 105 ºF e não tem água, é uma jornada para a morte”, disse o xerife.
Segundo ele, na maioria das vezes não são os agentes policiais que encontram os imigrantes, mas os imigrantes que procuram as autoridades pedindo socorro. Napier contou que 85% de suas ligações para Custom and Border Protection (CBP) são para pedir ajuda para resgatar imigrantes que ligaram para o 911 porque estão presos no deserto e, literalmente, morrendo de sede.
De acordo com o National Weather Service, o verão no Arizona atingiu recordes de calor neste ano de 2020, associado a uma temporada de seca que foi a maior desde 1895, com apenas 0,10 polegadas de chuvas registradas até agora durante o ano.
“Existem poucas ou nenhuma fonte de água aqui”, relatou Sophie Smith, co-fundadora da organização humanitária People Helping People, com sede em Arivaca (AZ). Ela explica que as poucas fontes que existem são, geralmente, tanques instalados por fazendeiros para matar a sede do gado.
“A água nesses tanques é suja e contaminada, mas é muito comum que as pessoas bebam para sobreviver”, contou.
Segundo Smith, a política criada em 1994 que retira recursos de proteção da fronteira seca para investir em portos e outras áreas não é por acaso.
“Está escrito na política”, disse Smith, “o texto diz que a patrulha da fronteira visa colocar as pessoas em terreno hostil, onde podem se encontrar em perigo mortal, como forma de desencoraja-las a fazer a travessia”, relatou.
Smith acredita que os imigrantes continuam chegando mesmo com todos os obstáculos porque têm pouca escolha. “Fugindo não só da violência econômica e da pobreza que criam circunstâncias muito mortais, mas ameaças literais à vida” concluiu.