“Eu penso que se a gente ensina a gente aprende mais”. A frase é do locutor, produtor de áudio publicitário e consultor de audiodescrição Rafael Nimoi, que junto ao músico e produtor fonográfico Luiz Henrique Kichel, o Luigi, decidiu criar um curso para ensinar cegos e pessoas que enxergam a editar vídeo e áudio. Rafael Nimoi é diretor da Radio AcheiUSA e deu entrevista para o jornal O Liberal, de Americana, interior de São Paulo.
Deficientes visuais, ambos integram o estúdio TraduSound, o primeiro como gerente e o segundo como consultor de qualidade. Localizada em Americana (SP), a empresa tem como uma de suas especialidades o desenvolvimento de conteúdos de audiodescrição, recurso que traduz imagens em palavras, permitindo que pessoas cegas ou com baixa visão consigam compreender conteúdos audiovisuais ou imagens estáticas, como filmes, fotografias e peças de teatro.
“Sou uma pessoa que sempre quis editar vídeo, até porque eu apresentava um programa de TV e, às vezes, eu queria editar a matéria e ficava sofrendo, porque ninguém tinha tempo de ensinar o [programa] Premiere para mim”, explica Rafael.
A virada ocorreu com a descoberta do programa Reaper, apresentado por Luigi, e que propicia vastos artifícios de acessibilidade. Luigi explica que, no curso, será apresentada a edição básica, que permite gravar um material bruto, cortar, colocar trilha, fazer fades, inserir logo, entre outras ações.
Ele é indicado para músicos que querem gravar em casa, interessados em criar vídeos para o YouTube, pessoas que trabalham com rádio e querem editar vinhetas, ou que querem produzir propagandas de rua, entre outras.
Para editar a imagem, eles se guiam pelo áudio e um leitor de parâmetros da imagem. “Porque ele tem essa marcação da intensidade do som e da intensidade das imagens”, explica Rafael. O trabalho ainda é facilitado pelo uso de atalhos no teclado do computador, descartando a necessidade de uso do mouse convencional.
O curso
O curso será realizado em parceria com a ONCB (Organização Nacional de Cegos do Brasil) e o programa Ágora Brasil, voltado à empregabilidade da pessoa com deficiência. Os interessados podem se inscrever até 5 de julho, mandando uma mensagem para o WhatsApp (11) 94121-0101 com seu nome e e-mail. Neste e-mail, receberá um link para que assista as aulas ao vivo. Elas vão começar no dia 10 de julho e ocorrer por quatro quartas-feiras, a partir das 20h, no YouTube. A licença vitalícia do programa usado para os trabalhos custa em torno de R$ 60.
Sem acessibilidade
Imagine você ter de ir para São Paulo toda vez que quiser ver um filme que te interesse. Essa é uma jornada necessária para pessoas cegas ou com limitação de visão da região que querem ter acesso ao recurso de audiodescrição, segundo profissionais do TraduSound.
Rafael Nimoi explica que está estabelecido em lei que, a partir de 2020, a estrutura de acessibilidade vai ter de estar presente em todas as salas de cinema, de acordo com lei já em vigor. O recurso consiste na tradução de imagens em palavras, permitindo que pessoas cegas ou com baixa visão consigam compreender conteúdos audiovisuais ou imagens estáticas. No cinema, é possibilitada pelo fornecimento de fones a quem exigir este recurso.
Somente neste ano, o TraduSound criou a audiodescrição para três grandes obras que já estão no cinema e são campeãs de bilheteria, segundo Rafael. Como o serviço é terceirizado, os nomes são preservados por conta de acordo estipulado em contrato.
Entre as parceiras da empresa americanense está a Centauro, multinacional que é dos mais antigos estúdios de dublagem de São Paulo, e a Unidub, que é do Wendell Bezerra, dublador dos personagens Goku e Bob Esponja.
Rafael e o músico e produtor fonográfico Luiz Henrique Kichel, o Luigi, analista de qualidade do estúdio, também desenvolveram um curso gratuito de edição de áudio e vídeo.
Ambos são cegos e, por meio do programa Reaper, buscam atrair para as aulas tanto cegos e pessoas com visão reduzida quanto quem enxerga. Uma das ideias do projeto também é fomentar o mercado da audiodescrição no interior paulista.
“A gente quer fazer o máximo de gente chegar até nós por meio de curso, para depois a gente buzinar na orelha deles que precisam ir ao cinema da cidade deles e cobrar a acessibilidade, porque essa acessibilidade ele precisa usar”, afirma Rafael. “Da mesma forma que a legenda é usada nos bares para a pessoa poder ler o que está sendo falado, isso pode ser pensado ao contrário, para que a pessoa possa acompanhar o que está acontecendo com audiodescrição”, acrescenta Luigi.