Entrevista a Nilo Dante, especial para o AcheiUSA
O jornalista Maurício Azêdo é uma das principais referências do cenário brasileiro. Veterano repórter, comentarista e editor em vários jornais do Rio, ele se notabilizou por intensa militância política, desde a juventude universitária. Participou ativamente da resistência à ditadura de 1964. Esteve ao lado de Leonel Brizola na fundação do PDT. Elegeu-se duas vezes para exercer mandatos parlamentares na Câmara Municipal, antes de ser designado para o Tribunal de Contas do Rio de Janeiro. Azêdo preside a Associação Brasileira de Imprensa desde maio de 2004, sucedendo a figuras do porte de Herbert Moses, Prudente de Moraes, neto, Barbosa Lima Sobrinho e Fernando Segismundo. Convocou destacados jornalistas para formar a diretoria, com os quais está conseguindo escrever um novo e vigoroso capítulo na historia da centenária ABI.
Recentemente, Maurício Azêdo esteve no Sul da Flórida, convidado a comparecer a um congresso da mídia brasileira no exterior. Concedeu ao Achei USA a entrevista que se segue.
ND – De sua vinda aos Estados Unidos para participar do I Congresso Internacional de Comunicação Brasileira, qual a impressão da comunidade de brasileiros que vivem na Flórida – cerca de 300 mil -, a grande maioria sem documentos formais da Imigração, mas que trabalham duramente e participam efetivamente da corrente produtiva do país?
Azêdo – Nossa permanência nos Estados Unidos foi por demais breve e não nos permitiu um contato amplo com a comunidade brasileira, exceto no que concerne a assuntos relacionados com imprensa e comunicação em geral, temas do Congresso para o qual fomos convidados. Entretanto, tivemos informação de que a comunidade de brasileiros na Flórida carece de uma organização que permita a defesa e a ampliação dos seus direitos, entre estes o da regularização de sua permanência no país, através da obtenção de documentos formais da Imigração. Com a formação da Associação Brasileira de Imprensa Internacional, uma das decisões do Congresso, creio que será possível obter avanços nessa questão, porquanto a comunidade brasileira passará a contar com um organismo capaz de levantar os seus problemas e discutir com as autoridades norte-americanas a implantação das soluções necessárias ou possíveis.
ND – Imagino que, como eu, você tenha ficado impressionado com a multiplicidade de jornais e revistas que os imigrantes brasileiros produzem nos Estados Unidos…
Azêdo – Realmente é impressionante a quantidade de publicações editadas nos Estados Unidos por brasileiros e em língua portuguesa. Só na área dos Estados da Flórida e da Geórgia, o Consulado-Geral do Brasil em Miami registrou a existência de cerca de 30 publicações, o que mostra a vitalidade do processo de produção de publicações por brasileiros em território norte-americano.
ND – Um dos aspectos mais interessantes, a meu ver, é que a maior parte das pessoas que operam esses jornais não possuía experiência anterior no ramo. Realizam enorme esforço, criam empregos e conseguem ser bem sucedidos, mesmo levando em conta que alguns têm o suporte das igrejas às quais estão ligados. Qual a sua visão desse improviso de sucesso?
Azedo – O êxito obtido por essas publicações resulta, antes de tudo, da persistência, da obstinação de brasileiros que há muito se radicaram nos Estados Unidos, como Al Sousa e Edilberto Mendes, que tiveram a sensibilidade, há mais de três décadas, de captar a necessidade da existência de publicações destinadas à comunidade brasileira. Como você assinala na pergunta, é uma trajetória de sucesso, sim, mas fruto de um trabalho incansável, de crença na possibilidade de êxito e de percepção do que seria adequado para garantir a circulação do veículo criado.
ND – Todos esses jornais são tablóides-de-distribuição-gratuita, à semelhança de notáveis exemplares do gênero que surgiram recentemente nos Estados Unidos. Cito o Examiner de Washington, o Red Eye e o Red Streak, de Chicago, o Quick, de Dallas, sem falar nos que circulam no metrô. Como você vê o avanço deste modelo de jornal mundo afora?
Azêdo – Penso que esse modelo de publicação tem vasto campo para se expandir, porque esses veículos são elaborados considerando a diversidade do público a que se destinam, como no caso daqueles que circulam nos metrôs, que oferecem assuntos atraentes expostos de forma a permitir uma leitura rápida. São uma espécie de fast press, que chegam ao público com informações variadas e úteis, mas não se constituem em formadores de opinião.
ND – Haverá espaço para os tablóides-de-distribuição-gratuita no Brasil?
Azêdo – Há certamente espaço para veículos de distribuição gratuita no Brasil, mas não necessariamente com o formato tablóide, que se enraizou no gosto do público em poucos Estados, alguns dos quais, como o Rio Grande do Sul, apresentam exemplos de grande sucesso editorial e empresarial, como a Zero Hora de Porto Alegre. No Rio e São Paulo já houve jornais de circulação gratuita que alcançaram grandes tiragens e inegável êxito empresarial, como os veículos denominados Shopping News criados nessas duas cidades nos anos 60. No Rio, houve mais recentemente um tablóide de distribuição gratuita que alcançou grande sucesso, o Balcão, que teve uma fase de fastígio, de grande êxito, mas não se consolidou.
ND – Os principais jornais brasileiros vêm sofrendo grande queda de circulação, segundo eles próprios informam ao Instituto Verificador de Circulação (IVC). A Folha de S. Paulo, que chegou a vender 1.4 milhão de exemplares aos domingos na segunda metade dos anos 1990, não passa de 380 mil nos domingos de hoje. O Globo também caiu muito (de 970 mil para 370 mil), assim como O Estado de S. Paulo e o Jornal do Brasil. A seu ver, qual a razão desse espetacular desabamento e como estancar o processo?
Azêdo – Sei que como estudioso do meio jornal você tem séries estatísticas acerca da evolução da circulação de veículos no Brasil. Gostaria de conhecê-las, ter acesso aos dados concretos. É certo que houve uma queda na circulação de jornais editados nos principais centros, como Rio e São Paulo, o que se deverá a inúmeros fatores, entre os quais o de que no Brasil jornal se tornou caro para grande parte da população, cujos salários estão aviltados por uma política continuada de desapreço ao valor do trabalho. Como um trabalhador que ganha 350 reais por mês – pouco mais de 150 dólares – pode comprar diariamente um jornal que custa quase um dólar e que aos domingos custa cerca de US$ 1,50? Num país com população empobrecida, jornal diário é artigo de luxo, infelizmente.
ND – Como se explica que alguns jornais de bom porte fora do eixo Rio-São Paulo não tenham sofrido desabamentos de circulação semelhantes, como é o caso de Zero Hora e Diário Catarinense, além da paulista Gazeta Mercantil?
Azêdo – Não sei se os exemplos citados possam oferecer uma base de avaliação das razões da queda de circulação dos jornais. A Zero Hora mantém uma circulação estável porque no Rio Grande do Sul é muito forte o hábito de aquisição e leitura de jornais diários, como se viu no passado com o Correio do Povo de Breno Caldas. E a Gazeta Mercantil é uma publicação que se dirige a um nicho do mercado, com alcance limitado em termos de circulação, que não terá passado dos 70 mil ou 80 mil jornais diários, se tanto.
ND – Como você encontrou a ABI ao assumir a presidência e quais os projetos para o futuro da entidade?
Azêdo – Encontramos a ABI com uma infinidade de problemas, especialmente de natureza fiscal, previdenciária e trabalhista, que estamos superando com muita determinação e, sobretudo, com muito trabalho. Digo-lhe que a ABI dá mais trabalho do que um ministério ou uma secretaria de Estado, mas estamos avançando e vendo a entidade reencontrar-se com o prestígio e a imagem de respeito que construiu ao longo de uma existência quase centenária: em abril de 2008 a entidade vai completar 100 anos. Nossos projetos são tantos que sua exposição não cabe no âmbito de uma entrevista que inclua outros assuntos, como esta.
ND – Na qualidade de veterano militante de causas sociais e ex-parlamentar do PDT, qual o seu sentimento quanto ao cenário político do Brasil?
Azêdo – O cenário político do Brasil é desolador, desestimulante, porque os homens públicos não cumprem os compromissos que assumem perante a cidadania durante a campanha eleitoral. Além disso, a vida pública está infestada de oportunistas, de aproveitadores, de ladrões, de gente que faz da coisa pública uma forma de enriquecer ilicitamente. Tudo isso é premiado com a impunidade: no Brasil, com a só exceção do juiz Nicolau, ladrão de dinheiros públicos não vai para a cadeia e ainda ri das pessoas de bem.
ND – Com a vasta experiência de quem sempre fez política no Rio de Janeiro, quem você acha que será eleito governador do Estado este ano?
Azêdo – Mantidas as tendências atuais, o candidato que se desenha com maiores possibilidades de vitória é o Senador Sérgio Cabral Filho, do PMDB. Digo tendências porque, tal como no futebol, a eleição pode ser uma caixinha de surpresas.
ND – Lula será reeleito?
Azêdo – Tal como no caso da pergunta anterior, também em relação à eleição para a Presidência da República o candidato com mais possibilidades de vitória é o Presidente Lula.
(*) Nilo Dante é jornalista, trabalhou em quatro revistas semanais e dez jornais do Rio de Janeiro, em cinco dos quais como diretor de Redação.