A foto oficial das primeira-damas, de dignatários presentes à última reunião da OTAN, chamou atenção do mundo pela presença de um homem, conjugue do premier de Luxemburgo, em meio a mulheres. Sublime, anedótico e, após muita reflexão, até sarcástico, num momento em que o mundo dá sérias guinadas em direção ao politicamente correto.
O gesto de Gauthier Destenay, parceiro de Xavier Bettel, mandatário daquela nação, de estar presente na foto, foi singelo à primeira vista mas nos faz pensar em tudo o que há de errado deste lado do oceano. Apesar dos milenares conflitos étnicos, os europeus levam a sério a sua agenda de promover justiça social. Tolerância, respeito e valorização da vida são pilares em suas constituições e não estão ali só para constar.
Aqui, no novo mundo, vivemos ainda na Idade Média, aquele período histórico de trevas. Nossas leis e constituições são criadas para serem desprezadas. Nossos políticos, que deveriam nos inspirar, são piores do que aquele cunhado lunático e explorador, encostado na família. Na época medieval, o serviço público era visto como o caminho mais fácil para se garantir uma vida estável e longeva. Maquiavel escreveu uma bíblia sobre isso e este parece ser o livro de cabeceira de todas as mães da América, que não querem outra coisa para seus filhos.
Daí o nosso desalento com a política. Enquanto que na Europa e em alguns países escandinavos o serviço público é meramente um dever cívico, aqui ele é visto como a melhor forma de enriquecer. Não existe emprego mais fácil, basta ter um enorme talento para mentir, falar o que todo mundo quer ouvir, fingir muito, negar as inconsistências e as recompensas cairão dos céus.
Políticos na Europa são pessoas comuns, que pisam na jaca de vez em quando, que denotam fraquezas, que genuinamente têm ideais. Os daqui são fidalgos, que procuram se blindar do escrutínio público quanto suas mazelas e seguem provocando estragos. Claro que temos políticos do bem, aqueles que não cedem aos interesses privados, que genuinamente se interessam pelo bem de todos mas esses são raros. O falecido Ted Kennedy era o tiozão do qual todos queriam ser sobrinhos. Viveu e morreu defendendo o direito à saúde publica para todos americanos. Jimmy Carter está até hoje construindo casas para os menos favorecidos e um congressista ou outro é visto de vez em quando com as mangas arregaçadas, trabalhando com a comunidade. Por outro lado, e esta é a maioria, temos um senador como Jesse Helms, que não faz nem questão de esconder que não está nem aí para o trabalhador comum e outros tantos políticos, que só se importam com seus egos.
No Brasil, conta-se com os dedos os políticos do bem. A grande maioria gosta de fazer o gênero “meu malvado favorito”. Não é à toa que Temer é comparado a mordomo de vampiro. Difícil encontrar um político com o qual você se sinta confiante para convidar à sua casa. O maior exemplo de todos, o lendário Maluf, acaba de ser condenado pela enésima vez por suas falcatruas e ninguém consegue puni-lo. Ele até já virou um precedente jurídico pois como alguém pode ser preso pelas mesmas razões, se ele nunca foi?
A resposta está na certeza da impunidade. No Brasil, somos governados por uma legião de malvados favoritos, que acreditam poder se perpetuar no poder. Difícil encontrar alguém que não se enquadre nessa caricatura. Gilmar Mendes, ministro do STF, por exemplo, precisaria nascer de novo para pelo menos parecer do bem. Na América a coisa é um pouquinho melhor, só mesmo Trump que destoa.
Enquanto a redenção não vem, precisamos aguardar o fim da Idade Média nas américas e torcer para que os avanços sociais no velho mundo influenciem por aqui de alguma forma. A qualquer momento precisaremos entrar naquela fase, em que acontecem as grandes revoluções sociais movidas pelas massas, extinguindo reinados, derrubando tiranos e inaugurando a Idade Moderna. Quem sabe, ainda nesta geração poderemos acertar os ponteiros com o resto do mundo e seguir no mesmo compasso da história?