Sou bom de cama: deito e durmo que é uma maravilha! (mas quando preciso ficar acordado, também fico…). Pouquíssimas vezes tive insônia na vida, geralmente causadas por diferença no fuso horário dos países que visito. Nesta minha última viagem ao Japão tive uma que durou mais de uma hora – aí fiquei com pena de quem tem insônia frequentemente.
No meio da noite tive um pesadelo que estava sendo forçado a beber álcool direto da bomba do posto de combustível, e acordei de sopetão (não devia ter tomado tanto saquê no jantar). Tudo bem, viro para o outro lado e durmo, como sempre. Não, desse lado não funcionou, vamos ver do outro. Nada. Na insônia os sentido ficam aguçados, principalmente a audição. Tinha alguma coisa no hotel em Narita que fazia “zuuuuuuuuummmmm” a cada 10 minutos, e não era o elevador. E aquilo começou a me dar nos nervos.
Depois de uns minutos rolando na cama, fiquei com receio de ter vontade de ir ao banheiro e despertar mais ainda – só levanto em casa se eu estiver extremamente necessitado, quando os sonhos com água corrente e banheiro ficam muito frequentes, ou se a urina começar a sair pelos ouvidos. Tentei usar o poder da mente: “não estou com vontade de tirar água do joelho, não estou com vontade de tirar água do joelho, não…” tarde demais. Levantei e fui ao banheiro. Mas antes tive que lembrar onde eu estava para não enfiar a fuça na parede – em uma viagem de uma semana no Japão fiquei em cinco hotéis diferentes.
Não acendo a luz para evitar despertar mais ainda. Mas fico com receio de errar a mira ou apertar sem querer algum dos botões daquele treco–latrina high-tech – cheia de botões com símbolos que seus criadores acham que todos entendem logo de cara. Alguns a gente deduze, outros evita apertar–vai que sai uma mãozinha de dentro querendo trocar o absorvente (parafraseando o Pasquim). Lavei as mãos e voltei a deitar.
Eu costumo usar um truque para voltar a adormecer, pensar em abobrinhas desconexas o máximo possível, a la Salvador Dali. Eu estava conseguindo fazer isso, até ouvir a maledeta torneira do banheiro pingar. No Brasil faço um sanduiche de cabeça usando o travesseiro para abafar os barulhos, mas travesseiros no Japão não são exatamente iguais aos que usamos. De um lado eles tem umas bolinhas dentro (é ruim) e do outro tem uns waffles duros (é horrível). Entonces… tive que levantar e apertar a droga da torneira. E claro que bati a cabeça na parte de cima do batente da porta do banheiro – o hotel foi construído para pessoas com menos de 1.80 de altura.
Estava quase pegando no sono e “zuuuuummmmmm”…. Comecei a lembrar de problemas e contas do escritório – não! Tenho que desconectar! Estou à mesa com o Chapeleiro Maluco da Alice no País das Maravilhas. Comendo arroz e feijão com leite condensado (droga, não devia ter comido tanto doce de feijão antes de deitar). Muda, muda. Ah… estou mergulhando no Caribe…olha que mar bonito… que placa é essa? Não estou entendendo nada, está em japonês! Droga, lembrei que estou no hotel com insônia.
Por que estou com frio? Nem liguei o ar condicionado. Não devia fazer isso, mas vou ver a temperatura lá fora pelo meu celular. Ah, tá zero grau, por isso que estou com frio. Será que alguém postou alguma coisa no meu Facebook? Não vou olhar! O vizinho também deve estar com insônia, ou dormiu com a TV ligada. E, of course, está em um programa de auditório em japonês (cá entre nós, a televisão aberta no Japão é uma tranqueira).
Estou andando de moto no meio de uma estrada deserta em uma ilha do oceano Pacífico…. que delícia….uma praia no fim da estrada, deixo a moto (que sai voando, transformada em uma águia) e vou caminhar na praia. Puxa, quanta concha legal na areia! Mas, por que essa gente está correndo na minha direção? Saindo do mar, vejo Godzila!!! Droga, estou no hotel no Japão…
Zuuuummmmm…..
Não posso levantar, são três da madrugada e tenho que pegar um voo amanhã cedo. Preciso dormir! Vou usar o truque numero dois, diminuir a respiração. Respirar beeeemmm devagar, pausadamente….inspirar…expirar…inspirar…hum, que cheiro doce é esse? Será que sobrou doce de feijão?
PS. Esqueci de perguntar no lobby do hotel que catso era o zuuuummm.