Histórico

Grupo de mulheres luta pela DL em Boston

Mulheres brasileiras articuladas de Massachusetts se organizam e já conseguiram ser ouvidas por parlamentares

Joselina Reis


Foto: José Ronaldo Ferreira

Valdirene Braga Oliveira, de 35 anos, é brasileira e como tantas outras mulheres imigrantes não possui carteira de motorista. O que poderia ser um grande incômodo se transformou em um caso de necessidade absoluta. Sem a carteira, Valdirene não consegue levar a filha de 7 anos para o médico e reabilitação. A menina nasceu com espinha bífida e precisa de cuidados constantes. A história das duas está servindo para impulsionar um antigo projeto da ong Grupo Mulher Brasileira, o Projeto da Carteira de Motorista (Safe Driving Bill) que já está nas mãos da Comissão Estadual de Transporte de Massachusetts.

Na quarta-feira (5), membros da comissão abriram o plenário para que a população pudesse expor sua opinião sobre o assunto. Pelos trâmites normais de qualquer projeto, o próximo passo será a discussão entre os membros sobre a relevância do assunto e, se aprovado, enviá-lo para a próxima comissão, a de Impacto Econômico.

“Essa é uma luta antiga, mas nós não vamos desistir em lutar pelos direitos básicos de todos os imigrantes, independente da condição imigratória”, avisa a diretora e fundadora do Grupo Mulher Brasileira, Heloisa Maria Galvão. Mesmo sabendo que as comissões estaduais não dão prazo para divulgar o parecer quanto a legitimidade ou não de qualquer projeto, Heloisa garante que ong não vai parar de pressionar.

Um abaixo assinado com quase 10 mil assinaturas, contando a história de Valdirene e de outros imigrantes na mesma situação, foi lançado há poucos dias com ajuda de outras ONG na internet (www.change.org/petitions/i-need-to-drive-my-daughter-to-the-hospital-pass-the-safe-driving-bill). O objetivo, segundo Heloisa, é atrair mais deputados estaduais (state representatives, em inglês) e senadores para a causa. Atualmente, cerca de vinte mandatários são simpatizantes ao projeto de lei em Massachusetts, sendo que a senadora Patricia Jehlen (D-MA) e a deputada Tricia Farley-Bouvier (D-MA) foram as que apresentaram o projeto à comissão.

O Grupo Mulher Brasileira juntou-se ao Safe Drive Coalition (Coalizão de Direção Segura, em português), que reúne mais de 50 entidades sem fins lucraticos nos EUA com um único objetivo: assegurar a todos os que vivem nos Estados Unidos, independentemente do estatus imigratório, possam ter o direito de dirigir. De acordo com a Safe Drive Coalition, atualmente os seguintes estados americanos oferecem o direito de dirigir aos imigrantes indocumentados: Washington, Utah, New Mexico, California, Oregon, Colorado, Illinois, Maryland, Nevada, Vermont e Connecticut. A capital dos EUA, Washington D.C. e o território de Porto Rico também oferecem o mesmo benefício.

Valdirene, que é capixaba, conta que veio para os Estados Unidos em 2004 em busca de uma vida melhor. Em 2006, sua vida mudou radicalmente com o nascimento da filha. “A minha filha não anda porque ela nasceu com um problema na espinha. Eu preciso levá-la à fisioterapia três vezes por semana, e muitas consultas médicas. Eu tenho medo de dirigir sem esse documento. Eu preciso de uma carteira porque tenho que levar minha filha para todas as consultas e tratamentos medicos, que provavelmente podem ajudá-la, e muito. Preciso ter certeza que estou dirigindo com segurança.”, conta seu drama.

A falta do documento, conta Valdirene, está limitando o tratamento da menina. “Eu tive que cancelar a equoteria (nome dado aos exercícios realizados em cima de cavalos), uma das mais eficientes nestes casos, porque eu tinha que dirigir uma 1 hora 40 minutos para chegar ao local e eu não tenho carteira de motorista.”, revela.

Grupo

O Grupo Mulher Brasileira (www.verdeamarelo.org) foi criado há 19 anos em Boston (MA) e tem o objetivo de fortalecer a comunidade brasileira no estado, independente das condições imigratórias. O grupo oferece clínicas gratuitas sobre imigração mensalmente, treinamento de liderança para mulheres entre outros serviços.

Mais de 500 pessoas comparecem a debate público pela DL

O plenário ficou pequeno para tantos imigrantes. A polícia de Massachusetts acredita que mais de 500 pessoas, maioria membros de organizações não governamentais que apoiam os direitos dos imigrantes, lotaram a audiência pública realizada no Palácio do Governo em Boston, Massachusetts na tarde de quarta-feira (5).

A participação dos imigrantes impressionou a deputada americana, a democrata Tricia Farley-Bouvier. “Fiquei impressionada com a presença dos imigrantes de todas as nacionalidades”, disse a deputada, co-autora do projeto de lei (Safe Driving H-3285) em conjunto com a senadora, também democrata por Massachusetts, Patricia Jehlen.

Outro fator que impressionou a representante democrata foram as alegações de alguns colegas e de contribuintes contrários ao projeto de lei. Entre as preocupações levantadas estão: o medo de que o estado de Massachusetts se torne um ‘estado fábrica de carteiras de motorista’ – como ficou conhecida a cidade de Washington D.C. desde que liberou a emissão de carteiras para indocumentados – de que se os imigrantes conseguirem a tão sonhada carteira podem tirar empregos de americanos e a de que os imigrantes bebem muito e por isso podem causar mais acidentes no trânsito. “Foram várias explicações ridículas e insanas para não liberar a carteira de motorista”, conta Tricia Farley-Bouvier.

Já do lado favorável à liberação do documento, os argumentos são principalmente a preocupação quanto a segurança no trânsito e a possibilidade de mais dinheiro para os cofres públicos. “Isto é algo justo. Eu pago impostos para manter meu privilégio de dirigir e muitos dirigem sem pagar aos cofres públicos. E mais: essas pessoas dirigem sem conhecimento de nossas leis e muitas vezes sem seguro”, exemplifica a parlamentar.

De acordo com os dados mais recentes, o estado de Massachusetts tem aproximadamente 120 mil imigrantes indocumentados.
Tricia Farley-Bouvier acredita que a comissão de transporte deve dar um parecer até o final do mês de março. Pelas regras da casa, os projetos de lei apresentados em 2013 precisam ter um parecer, favorável ou desfavorável, até a terceira semana de março, quando o ano oficialmente termina para os trabalhos dos parlamentares.

Uma alternativa da comissão seria requerer mais estudos, o que deixaria o projeto em banho-maria durante o ano de 2014, porém não acabaria de vez com o sonhos dos indocumentados. Por outro lado, se o parecer for favorável, o projeto segue para a próxima comissão e, apartir daí, para votação e sanção do governo estadual.

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