Um grupo internacional identificou, numa tacada só, quatro genes envolvidos no surgimento do câncer de mama. A boa notícia é que eles trazem um risco relativamente baixo da doença para as mulheres que os possuem. A má é que eles são bem comuns na população: um deles, por exemplo, está presente em uma em cada seis leitoras deste texto.
A descoberta é o maior avanço na guerra da genética contra o câncer de mama desde os anos 1990, quando foram isolados os primeiros genes ligados à doença, que mata 500 mil pessoas todos os anos.
Embora ainda não seja possível fazer testes para detectar os novos genes, os cientistas acham que a nova descoberta permitirá identificar mulheres jovens com risco aumentado de desenvolver a doença e submetê-las mais cedo à mamografia.
O estudo, publicado na forma de três artigos científicos nas revistas “Nature” e “Nature Genetics”, também é um marco na pesquisa básica: é a primeira vez que se faz uma garimpagem em dois terços dos 3 bilhões de letras genéticas do genoma humano em busca de trechos alterados do DNA (mutações) ligados ao tumor de mama.
E os pesquisadores “bamburraram” na procura: numa amostra de quase 50 mil mulheres, eles encontraram mutações em quatro genes onde não se sabia existirem fatores de risco e uma em uma região do genoma onde ainda não se identificou nenhum gene.
Variações em um desses genes –o FGFR2, presente em 16% da população– aumentam o risco de tumor de 1 em 11 para 1 em 6 em portadoras de duas cópias do gene.
Até agora, os genes mais importantes ligados ao tumor de mama já descobertos eram o BRCA1 e o BCRA2. Mulheres com duas cópias alteradas de um deles em seu DNA (cada um de nós recebe duas cópias de cada gene, uma do pai e uma da mãe) têm de 50% a 85% de risco de ter a doença.
Mas ambos são raros, e só explicam de 5% a 10% dos casos de câncer de mama. Mesmo assim, sua detecção em testes genéticos faz várias mulheres com histórico familiar da doença se submeterem à extração preventiva do seio.
As mutações recém-identificadas, juntas, explicam apenas 4% dos tumores de mama. “Portanto, não é provável que isso provoque uma onda de mastectomias preventivas”, disse à Folha o geneticista Marcelo Nóbrega, da Universidade de Chicago (EUA).
“Mas uma série de estudos a partir de agora associarão essas variações genéticas novas a respostas a tratamentos variados, prognóstico de progressão da doença e sobrevida. É possível que, daqui a vários anos, desses estudos possam surgir indicações de terapias específicas para cânceres de mama com assinaturas genéticas diferentes”, continuou Nóbrega.
Arrastão
O método usado para a identificação, a busca no genoma completo, tem se tornado possível sobretudo devido ao barateamento da tecnologia genômica. Segundo Nóbrega, com ele os cientistas já pescaram no último ano e meio novas variantes genéticas associadas a diabetes e câncer de próstata.
Bruce Ponder, autor-sênior do estudo, compara o método a uma pesca com redes de arrasto, em vez dos caniços usados até agora para descobrir genes de interesse no caudal do DNA.
Isso abre as portas para a identificação de mais genes ligados ao câncer de mama –75% dos casos da doença ainda não têm causa identificada.