O filósofo francês Michel Foucault cunhou a expressão “Fique nu… mas seja magro, bonito, bronzeado!”para citar o autoritarismo subjetivado no corpo.
Eu sempre fui branquela, mesmo passando férias longas nas praias de Santos entre os anos 60 e 70. Ficávamos três meses no apartamento de minha avó no Embaré – para nós era tudo festa, mas para minha mãe que tinha que ficar sozinha com os três filhos, nem tanto…
Nos primeiros dias de praia ficávamos de camiseta praticamente o tempo todo, e embaixo do guarda-sol. Mas assim mesmo o tom camarão surgia em meu irmão mais novo e em mim, que éramos mais “albinos” em comparação com nosso irmão mais velho que se bronzeia mais fácil.
Não existia protetor solar, e o que se usava mais na praia eram os bronzeadores – produtos com ingredientes considerados meio insanos hoje em dia. A ideia era torrar o máximo possível, o quanto antes melhor.
Nós não usávamos bronzeadores, no máximo Hipoglós no nariz ou nas feridas causadas pelas queimaduras solares. Nas primeiras semanas era difícil dormir à noite, tudo ardia e às vezes minha mãe nos passava Caladryl para aliviar um pouco as queimaduras. Como o apartamento era pequeno, eu e meu irmão Marcello dormíamos na sala em dois sofás camas revestidos em courvin – uma maravilha para grudar em pele soltando das queimaduras!
As queimaduras iniciais viravam bolhas que estouravam e sangravam, aí a gente queimava por cima das feridas. Essas feridas viraram sardas em meu rosto e nos ombros, que até hoje são reativadas quando tomo sol, e por sorte não viraram câncer de pele (acho).
Assim que começamos a usar protetor solar as coisas melhoraram muito – mas no começo usava fator 8 e achava que seria suficiente. Na minha primeira saída para mergulhar na lancha de um amigo, descobri dolorosamente que o fator 8 não era o bastante para proteger minha pele translúcida: meu rosto até inchou das queimaduras! O efeito do sol no meio do mar é muito mais nocivo que na praia, o vento nos faz achar que “nem está queimando tanto assim”. Puro engano….
Conforme minha vida foi sendo mais direcionada às atividades de mergulho, fui aprendendo que usar protetor solar era importante, e sempre usava o mais forte que encontrava. Só que em viagens de mergulho era difícil e complicado ficar passando o tempo todo, assim eu ainda dava uma “torrada” na pele. Depois de dez ou quinze dias mergulhando, eu chegava a ficar bem bronzeado – cor que sumia depois de poucos dias que eu chegava ao escritório em São Paulo.
Nunca entendi esse desespero de querer mudar a cor da pele, principalmente pelo fato de que em excesso isso faz mal. Além do sentimento de inutilidade em ficar virando feito panqueca em esteira de praia, sem fazer absolutamente nada. Uma das amigas de minha tia (que é dez anos mais velha que eu) vivia bronzeada o ano inteiro, hoje perto dos setenta anos ela aparenta ter noventa e parece uma uva passa de tanta ruga que tem no rosto. O pior é o risco do câncer de pele – mas para essa gente insatisfeita com a própria cor do corpo, esse é um risco que vale a pena!
Como aqueles bronzeadores feitos com óleo diesel não existem mais, a molecada partiu para receitas “infalíveis” encontradas na internet. Há uns anos algumas adolescentes foram parar no hospital e uma chegou a falecer. Elas usaram uma receita de chá de folhas de figo que prometia bronzear rápido – tiveram queimaduras graves pelo corpo todo. E o pior é que os efeitos surgiam depois de um ou dois dias do uso inicial, o que aumentava os efeitos nocivos já que elas usavam a mistura por mais de um dia seguido.
Então, eu sou branco e pretendo continuar assim – de acordo com a expressão criada por Foucault estou proibido de ficar nu, já que não me encaixo em nenhum dos três requisitos!