Antonio Tozzi Esportes

Está na hora de o futebol brasileiro instituir o fair play financeiro

No play fair financeiro, clubes só devem contratar jogadores valorizados, de acordo com sua capacidade de investimento (Foto: wikipedia)
No play fair financeiro, clubes só devem contratar jogadores valorizados, de acordo com sua capacidade de investimento (Foto: wikipedia)

Pessoal, vamos admitir um fato: o futebol brasileiro estava chato nos últimos cinco anos, com o predomínio de Flamengo e Palmeiras. As duas equipes dividiam os troféus das principais competições, deixando para os rivais apenas a “secação”, ou seja, torcer contra eles.

Mas por que esses dois clubes se destacaram em um país, onde o equilíbrio e a imprevisibilidade eram marcantes. Sou do tempo em que, antes de começar o Campeonato Brasileiro, a maioria dos torcedores e analistas diziam: “Temos 12 clubes que pode se sagrar campeão”. Essa máxima se apoiava no retrospecto de que haviam 12 clubes tradicionais e de maiores torcidas que dominavam o futebol brasileiro. Seriam eles os quatro paulistas (Corinthians, Palmeiras, Santos e São Paulo), os quatro cariocas (Botafogo, Flamengo, Fluminense e Vasco da Gama), os dois mineiros (Atlético-MG e Cruzeiro) e os dois gaúchos ( Grêmio e Internacional).

Entretanto, como nada na vida é imutável, o futebol também mudou e alguns desses clubes populares foram perdendo o brilho e viver apenas das glórias do passado, enquanto outros protagonistas começaram a surgir no cenário futebolístico, graças à uma maior organização. Assim, clubes antes vistos como regionais, começaram a ocupar as vagas dos “grandões falidos”. 

O primeiro que iniciou o processo de desafiar as potências de então foi o Ahtletico-PR. Comandado com mão de ferro por Ricardo Petraglia, o Rubro-Negro de Curitiba  passou a se tornar uma pedra no sapato dos favoritos. E os resultados apareceram. Para se diferenciar de seus homônimos, o Atlético-PR foi rebatizado de Athletico e se tornou o clube de maior destaque do Paraná, superando seu rival Coritiba, que era a primeira força do estado e dono da maior torcida. 

Nesse período, o clube se tornou campeão brasileiro em 2001 e vice-campeão em 2004, campeão da Copa do Brasil em 2019, campeão da Copa Sul-Americana em 2018 e 2021 e vice-campeão da Copa Libertadores da América em 2005 e 2022.

Outro fenômeno surgiu no Nordeste com a chegada do Fortaleza no cenário principal. Depois de amargar algumas temporadas na Série C, o projeto de alguns dirigentes do clube cearense devolve o orgulho aos torcedores e volta aos seus anos de esplendor, enchendo de orgulho os torcedores da segunda equipe mais popular do Ceará. Aliás, com o crescimento do Tricolor do Pici, o Ceará pode ver o número de torcedores ser superado pelo rival local, porque a diferença entre eles é bem pequena. 

Sob a batuta de Marcelo Paz, o clube se reergueu. O dirigente contratou Rogério Ceni, ídolo do São Paulo, mas, com pouca experiência como treinador de futebol. Ele se revelou uma grata surpresa, ao reestruturar o setor de futebol do clube, apontando a necessidade de investir em um centro de treinamento mais moderno, na compra de equipamentos atualizados, na formação de uma categoria de base mais efetiva. Assim, o clube ganhou a Copa do Nordeste e alguns títulos estaduais. 

Após sua saída a convite do Flamengo, o clube nordestino trouxe o técnico Juan Pablo Vojvoda que dirigia o Lanus da Argentina para ocupar a vaga de Ceni. A aposta se revelou certeira. O argentino caiu no agrado dos torcedores e a recíproca é verdadeira: Vojvoda e sua família amam morar na capital cearense e ele conta com o respaldo de Marcelo Paz e o carinho dos torcedores. Além do hexacampeonato estadual, o Fortaleza conquistou mais duas Copa do Nordeste (2022 e 2024) e foi vice-campeão da Copa Sul-Americana em 2022, entre outros títulos.

Por falar em Rogério Ceni, ele foi escolhido pelos administradores da SAF (Sociedade Anônima de Futebol) que assumiu o Bahia. E não é uma SAF qualquer. Trata-se do Abu Dhabi United Group, que pertence ao sheik Mansour bin Zayed Al Nahyan dos Emirados Árabes Unidos, para integrar o projeto do grupo no Brasil. Assim, o Bahia passou a ter como co-irmãos o Melbourne City (Austrália), Yokohama Marinos (Japão), Sichan FC (China), Montevideo City Torque (Uruguai), New York City (Estados Unidos), que se sagrou campeão da MLS em 2021, Girona (Espanha), que ficou com o vice-campeonato na temporada passada, e o Manchester City, a joia da coroa. 

Hoje rivalizando-se com o Real Madrid, o clube de menor torcida da cidade de Manchester passou a ocupar um lugar de destaque no cenário futebolístico mundial. O Manchester City, comandado por Pep Guardiola, é o atual decacampeão inglês, com as glórias recentes: temporadas do City com conquistas da EPL (English Premier League): 23/24 ,  22/23 ,  21/22 ,  20/21 ,  18/19 ,  17/18 ,  13/14 ,  11/12. Na temporada de 22/23,o Manchester City se sagrou campeão europeu pela primeira vez em sua história, Ou seja, o investimento feito pelo sheik transformou o segundo clube de Manchester numa potência mundial.

Desse modo, é justo que os torcedores baianos sonhem com títulos de expressão, como Brasileirão (atualmente está na sétima colocação), mas monitorando os líderes e objetivando assegurar uma vaga direta para a Copa Libertadores da América no próximo ano.

Red Bull Bragantino é outro exemplo: um time pequeno do interior paulista, de repente, recebeu uma injeção financeira e se tornou uma equipe de respeito, graças ao fato de se tornar um dos integrantes do grupo Red Bull, juntamente com Red Bull Salzburg (Áustria), Red Bull Leipzig (Alemanha) e New York Red Bull (Estados Unidos). No ano passado, o time chegou a brigar pelo Campeonato Brasileiro, porém, perdeu o gás na reta final. Este ano, entretanto, está fazendo uma campanha ruim e luta para escapar do rebaixamento para a Série B.

Bem, falando-se em SAF, inegavelmente a que deu mais certo foi a do Botafogo. O Eagle Football Club, do americano John Textor, vem realizando investimentos significativos em seu elenco. Textor contrata jogadores para seu grupo e os distribui de acordo com suas preferências, pois ele é controlador também do Olympique Lyonnais (França) e tem participação no Crystal Palace (Inglaterra).

Os presidentes do Flamengo, Rodolfo Landim, e do Palmeiras, Leila Pereira, são críticos do excesso de liberdade dado pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Logicamente, os adversários estão ironizando as críticas, porém, o que eles estão falando faz sentido. Afinal, eles passaram por períodos difíceis na década passada, com o Palmeiras sendo rebaixado para a Série B pela segunda vez e o Flamengo ficando bem perto disto.

Os clubes eram bem desorganizados, a ponto de Vampeta – hoje comentarista da Jovem Pan – ter cunhado uma frase lapidar quando atuava pelo Flamengo: “Eles fingem que jogam, a gente finge que joga”, referindo-se aos constantes atrasos no pagamento dos salários dos jogadores.

Em São Paulo, o cenário não era diferente. Quando Paulo Nobre foi eleito presidente do Palmeiras, a situação era caótica. O clube não tinha nem como pagar as contas de água e luz. Aí, o novo mandatário decidiu tomar atitudes radicais. Por ser um sujeito rico e apaixonado pelo Verdão, foi ao mercado para tomar dinheiro emprestado em seu nome. Afinal, ele tinha bom crédito enquanto o Palmeiras não. Portanto, as taxas de juro oferecidas pelos bancos eram mais baixas. A partir daí, ele contratou Alexandre Mattos como diretor de futebol e eles começaram um movimento agressivo contratando bons jogadores (que antes se recusavam a jogar no Palmeiras) e investindo na formação de uma ótima estrutura para as categorias de base, comandada por João Paulo Sampaio.  Tudo isto também contando com a verba do patrocínio obtido com o grupo Crefisa/FAM, de Leila Pereira e José Roberto Lamacchia, palmeirense fanático. Pouco a pouco, o clube foi sanando suas dívidas e pagando bons salários aos jogadores, além de ter montado um centro de treinamento a nível europeu. O resultado disto vem-se refletindo em várias conquistas nas categorias de base, na revelação de jovens talentos – que entregam retorno esportivo e possibilitam excelente retorno financeiro -, e sobretudo faturando títulos expressivos para deleite de sua torcida.

Do lado carioca, o grupo encabeçado por Eduardo Bandeira de Mello fez algo similar no Flamengo. Eles colocaram a casa em ordem e. no início, montaram equipes modestas, enquanto iam aproveitando a força da maior torcida do Brasil para reerguer a instituição. Os resultados começaram a aparecer, com conquistas memoráveis e atingiu o ápice em 2019 quando o técnico português Jorge Jesus montou um time dos sonhos que jogava e encantava. Ele chegou ao ponto de ter mais títulos do que derrotas no período em que dirigiu o Flamengo. Ele teve de deixar o clube na época da pandemia e, ainda hoje, deixou muitos torcedores saudosos. Depois dele, passaram vários treinadores, mas, nenhum deles caiu no gosto da torcida, apesar de terem conquistados troféus importantes. O Palmeiras, por sua vez, decidiu ficar com Abel Ferreira, que comanda a equipe há quase quatro anos.

Agora, com o fortalecimento dos rivais, essa hegemonia pode chegar ao fim. Isto é saudável, mas, deve seguir algumas regras. O Botafogo, por exemplo, liderou o Brasileirão no ano passado durante várias rodadas, entretanto, entrou em pane nas rodadas finais e permitiu ao Palmeiras conquistar o bicampeonato. Textor investe pesado na formação do Alvinegro carioca, utilizando o estratagema de intercambiar jogadores entre suas outras equipes do grupo Eagle Football Club. Ou seja, o Botafogo tem um nível de investimento incompatível com o seu faturamento, o que se torna desleal com seus concorrentes. O próprio Textor alertou sobre a possibilidade de o Bahia se tornar imbatível graças ao dinheiro que jorra no Abu Dhabi United Group.

Pior ainda, é o que vem ocorrendo com o Corinthians. O Alvinegro paulista estava afundado em dívidas no final do ano passado, com cerca de R$ 2 bilhões. Com isto, os sócios e conselheiros votaram na oposição elegendo Augusto Melo. Em seu primeiro ano de mandato, a situação piorou. O Timão foi mal no Paulistão, correu risco de rebaixamento e entrou no Brasileirão sem confiança. Desta forma, o Corinthians está fazendo um campeonato de pouco brilho e se encontra na zona de rebaixamento. 

Com medo de ser o presidente que levou o Timão para a Série B, Augusto Nunes abriu a carteira e trouxe jogadores de alto nível e caros, como Rodrigo Garro, Carrillo, André Ramalho, Igor Coronado e a estrela holandesa Memphis de Pay. Na semana passada, os próprios dirigentes corintianos admitiram que a dívida subiu para R$ 2,3 bilhões. Apesar de ter montado uma equipe galática, o clube não paga fornecedores, agentes, atrasa salários de jogadores e funcionários, etc. Ou seja, o clube não possui lastro para fazer os investimentos que têm feito. Por isto, dirigentes de Palmeiras e Flamengo  pedem o fair play financeiro, como já ocorre nas ligas europeias.

Particularmente, concordo com eles. Todos têm direito a formar times vencedores, todavia, é preciso antes fazer a lição de casa e sanear suas dívidas, antes de investir forte no futebol, como, alíás, fizeram Flamengo e Palmeiras.


Corinthians atropela Fortaleza e é o primeiro semifinalista da Sul-Americana

Romero abriu o placar para o Timão e confirmou que está em uma fase excelente no renovado Corinthians (Foto: Rodrigo Coca/ Agência Corinthians)

O público de 44.483 pagantes, que proporcionou uma renda de R$ 2.510.922,50 saiu exultante da Neo Química Arena  noite de terça-feira (24). Afinal, o Corinthians fez uma grande exibição, venceu o Fortaleza por 3 x 0 e avançou com autoridade às semifinais da Copa Sul-Americana. O torcedor comemorou um confronto perfeito, com placar agregado de 5 x 0, viu seus principais nomes jogarem muito e ainda teve tempo de testemunhar a primeira assistência do holandês Memphis Depay pelo Timão. 

Todos os gols saíram no segundo tempo, com Romero, Igor Coronado e Pedro Henrique. O Leão, que havia perdido o duelo de ida das quartas de final na Arena Castelão, tinha mesmo uma missão ingrata em Itaquera. Ao Corinthians, agora, restam três jogos para o sonho do título inédito: as duas semifinais estão garantidas, e, com as atuações diante do Fortaleza, é possível sonhar com mais. No caso, com a grande final do dia 23 de novembro, em Assunção, Paraguai. 

O Corinthians volta a campo no próximo domingo (29) para o clássico contra o São Paulo, no Mané Garrincha, em Brasília. Já o Fortaleza recebe o Cuiabá no mesmo dia, na Arena Castelão. Os dois jogos são pela 28ª rodada do Brasileirão.

Compartilhar Post:

Baixe nosso aplicativo

Exit mobile version