Os próximos dias serão de muita expectativa para os indocumentados que vivem na Flórida. Isso porque o governador Ron DeSantis quer colocar em pauta, o mais rápido possível, um abrangente e rigoroso pacote de leis imigratórias. As medidas dizem respeito a questões de educação, saúde e emprego, entre outras, numa clara resposta às políticas do governo federal para o setor. DeSantis está em campanha para ser indicado o candidato republicano à Casa Branca, nas eleições de 2024.
“O objetivo é proteger a nossa população da grave crise originada nas fronteiras do país e do fluxo descontrolado de imigrantes para os Estados Unidos, devido à inoperância da administração Biden. A Flórida não é um estado santuário para indocumentados”, afirmou o governador. Em sua justificativa para adotar leis mais restritivas, ele ressaltou que a região gastou mais de US$ 310 milhões com cuidados de saúde para pacientes em situação imigratória irregular durante o ano fiscal de 2020, e insinuou que a chegada de indocumentados à Flórida pode ter relação com o aumento da criminalidade, a falta de emprego para profissionais americanos e a perda de qualidade da educação no estado.
Em função disso, o projeto de lei 1718 já está tramitando no senado estadual e deve ser votado nas próximas semanas, com a intenção de entrar em vigor no dia 1º de julho. Entre os tópicos, o que mais chama a atenção é a exigência para que hospitais coletem informações do status de imigratório de qualquer paciente durante o processo de admissão ou registro na unidade. A lei não proibiria o tratamento, mas a decisão certamente desencorajaria os indocumentados de procurar atendimento.
O pacote prevê ainda que condados e cidades estarão proibidos de fornecer fundos a qualquer pessoa, entidade ou organização no tocante a documentos de identificação sem prova de legal nos Estados Unidos (visto válido), além de aumentar as multas a empregadores e empresas que contratarem profissionais sem a autorização de trabalho. DeSantis pretende também impedir o acesso de estudantes beneficiados pelo DACA (o programa de apoio aos chamados “Dreamers”) aos descontos diferenciados nas mensalidades de universidades públicas para aqueles que vivem no estado e ainda invalidar as carteiras de motorista emitidas para estrangeiros em outros estados. Por fim, há a possibilidade de acusação criminal a quem abrigar, contratar e transportar indocumentados.
Nunca é demais lembrar que os republicanos detêm a supermaioria do senado estadual, com 28 legisladores, contra apenas 12 democratas. Ou seja, a aprovação do projeto é praticamente garantida. Segundo especialistas, caso aprovada, esta seria a legislação mais restritiva no país desde a polêmica SB 1070, do Arizona, promulgada em 2010, que concedeu poderes aos policiais locais de deter qualquer indivíduo para questionar seu status imigratório.
As medidas têm gerado forte reação, de ambos os lados. Os que defendem o projeto de lei, argumentam que a intenção não é prejudicar a imigração, mas garantir o cumprimento das leis. “Quem vem para a América, deve optar pelos procedimentos certos. Não queremos atrapalhar os imigrantes que estão aqui legalmente”, disse a senadora estadual republicana Debbie Mayfield, num das sessões em Tallahassee. Os críticos alertam, porém, que a proposta deve não apenas gerar insegurança entre a população, mas também prejudicar a economia e aumentar o preconceito racial no estado.
Um outro aspecto apontado por especialistas é o impacto que tal decisão pode ter na corrida presidencial. O pacote de DeSantis certamente agrada a parte do eleitorado conservador no país, mas também representa um risco de perda de votos importantes na Flórida e outros estados com forte presença imigrante. Isso demonstra que os Estados Unidos continuam polarizados em relação ao tema.
O Texas segue o mesmo caminho da Flórida, e os políticos daquele estado têm tentado uma expansão significativa no programa de controle de imigração promovido pelo governador republicano Greg Abbott, inclusive com a criação de uma força policial de fronteira. Já os governadores Eric Holcomb, de Indiana, e Spencer Cox, de Utah, ambos republicanos, pediram ao Congresso que aprovasse uma reforma abrangente da imigração, citando o valor dos trabalhadores estrangeiros em seus estados. No Utah, inclusive, foi aprovada uma lei estendendo a cobertura de saúde a todas as crianças de baixa renda, independentemente do status imigratório.
Segundo Tanya Broder, advogada do National Immigration Law Center, Flórida e Texas estão na contramão do que os Estados Unidos e sua população querem. “Houve um crescimento constante de políticas inclusivas em todo o país e no espectro político”, garantiu a advogada, enfatizando que a maioria dos eleitores defendem leis imigratórias mais justas.
De acordo com as estimativas, mais de 2,5 milhões de imigrantes chegaram aos Estados Unidos de forma ilegal em 2022, principalmente pela fronteira sul (na divisa com o México). A Flórida também tem enfrentado essa onda e houve um aumento no número indocumentados chegando à região em barcos vindos de Cuba e do Haiti. Pelos cálculos das autoridades, o estado possui cerca de 800 mil indocumentados, enquanto o número de estrangeiros nesta situação no país já ultrapassou a marca de 12 milhões.