Uma motocicleta, 100 dias, 27 mil quilômetros, 14 países e um sonho. Assim pode ser resumida a aventura do mineiro Marcone Gomes de Oliveira, que está muito próxima de ser concluída: viajar em duas rodas de Governador Valadares, sua cidade natal, ao Alasca, no extremo noroeste dos Estados Unidos. A chegada a Fairbanks, o ponto final do percurso, está prevista para meados de agosto. Até lá, o valadarense ainda tem um longo caminho pela frente, em que ele vai passar por lugares icônicos, como a Golden Gate Bridge (San Francisco), Grand Canyon (Arizona) e a Rota 66, a famosa estrada que liga Los Angeles a Chicago e que faz parte da “bucket list” de qualquer motoqueiro que se preza.
O AcheiUSA falou pelo telefone com Marcone logo depois de ele cruzar a fronteira entre o México e os EUA, na cidade de St. Teresa, no Novo México. Até aquele momento, o brasileiro havia percorrido 18 mil quilômetros (mais de 11 mil milhas) desde que saiu de Valadares, no dia 6 de maio, a bordo de sua companheira de estrada há 14 anos – a moto de 250 cilindradas que ele chama carinhosamente de ‘Tornadinha’. “Essa viagem é um desejo antigo e planejei o roteiro nos últimos oito anos. Agora é a parte mais agradável… aproveitar cada segundo e curtir as experiências e o visual”, disse Marcone, durante uma parada para abastecimento e descanso. Sem patrocínios, ele economizou dinheiro e, para colocar em prática o seu propósito, contou com a ajuda de familiares e amigos.
O objetivo é chegar ao Alasca na segunda ou terceira semana de agosto, antes do fim da estação, para evitar possíveis tempestades de neve, que já começam antes mesmo do outono por lá. Para isso, ele tem rodado diariamente 700 quilômetros (435 milhas) em média, sempre durante o dia. “Daqui pra frente vai ser mais fácil, pois o verão nos EUA permite que eu rode até 8pm, com céu claro”, explicou Marcone. No trecho da América do Sul ele enfrentou muito frio, e a chuva foi o maior obstáculo na América Central: tempestades entre o Panamá e o Belize atrasaram a programação em cerca de 10 dias, de acordo com a planilha original.
Esse, porém, não foi o maior problema. “Em todos os países até aqui enfrentei uma burocracia sem tamanho, pois além das questões imigratórias é obrigatório conseguir uma permissão temporária para circular com a moto em cada território e ainda apresentar atestados de vacinação. Na Nicarágua, por exemplo, fiquei mais de quatro horas para pagar o imposto devido e obter a documentação”, conta Marcone. Para sua surpresa, não houve qualquer dificuldade na fronteira sul dos Estados Unidos, e ele foi liberado em questão de minutos. Nem transtornos mecânicos, comuns em expedições longas, atrapalharam o percurso – trocas de pneus, filtros e do rolamento traseiro, uma revisão nos freios e… só. E ele torce para que até o Alasca continue assim.
Mas, como se diz, a jornada é mais importante que o destino. E quando tudo vai bem no aspecto técnico do trajeto, sobra mais tempo para aproveitar o que uma aventura desta proporciona. Ele não abre mão de conhecer mais a fundo alguns locais por onde passa – e isso pode incluir um mergulho nas águas cristalinas do Caribe ou apreciar as grandes pirâmides maias em Tikal, na Guatemala. “Todos os segundos são especiais, mas destacaria a passagem pelos vulcões no Peru e Equador, a travessia entre a Colômbia e o Panamá e, especialmente, as belezas do México”, recorda Marcone. Agora, nos EUA, ele também vai visitar atrações além dos cartões-postais: fã de Breaking Bad, o mineiro já programou paradas em locais eternizados pela série norte-americana, como a casa do protagonista Walter White, em Albuquerque (Arizona).
As fotos e detalhes de toda a expedição provavelmente estarão num livro. Marcone pretende mostrar um pouco de sua façanha através das imagens, que estão sendo divulgadas, aos poucos, na mídia social (Instagram @viajantesdareal): “Todo o dinheiro arrecadado com o livro de fotografias será doado a uma instituição de caridade, como forma de retribuição à forma como tenho sido abençoado nesta excursão”, revela. E, nesse sentido, Marcone ressalta que o ponto alto da jornada não está em paisagens ou pontos turísticos, mas nas pessoas que encontrou pelo caminho. Ao mencionar algumas situações durante o nosso bate-papo, ele confessou ter ficado com lágrimas nos olhos de emoção e agradecimento.
Um dos momentos mais marcantes aconteceu há poucos dias, quando um motociclista panamenho que conheceu através de grupos de WhatsApp cedeu um espaço com beliches, banheiro, geladeira e outras amenidades, onde o brasileiro passou alguns dias para descansar. “O nome dele é Bobby e ele está inclusive passeando de moto pelo Brasil agora. Mesmo à distância, ele disponibilizou o local, na verdade um contêiner mobiliado, como faz com qualquer motoqueiro que passa pela região. Trata-se do ‘Refúgio Mamao’ e fica perto da fronteira com a Costa Rica”, conta Marcone, enfatizando que há muitos outros exemplos de solidariedade nesta viagem: “A comunidade dos moto clubes é muito unida”, confirmou. E acrescentou que muito se deve a pessoas como Evelyn e Gary, da Costa Rica, um casal que recebe viajantes em sua própria casa, e o dentista Miguel Urista, que vive na região de Jalisco e organizou um grupo de apoio para motociclistas no México e na América Central para ajudar aventureiros sobre duas rodas.
Morador de Red Deer, na Província de Alberta, no Canadá, Marcone é casado e diz que o próximo passeio será ao lado da esposa, a canadense Kimberly. O roteiro ainda não está definido, mas será algo bem menos ousado do que atravessar as Américas, como desta vez. “Ela me incentiva demais e tem acompanhado cada instante da trajetória”, explica o brasileiro. Marcone também tem palavras de gratidão a todos aqueles que têm oferecido suporte, até mesmo psicológico, para amenizar os desafios da experiência – entre eles, os irmão Fernando e Willian, este último, inclusive, residente em Pompano Beach, no Sul da Flórida. “Sinto como se eles estivessem na garupa da Tornadinha”, brinca.
Ao citar a sua primeira viagem de moto, entre Valadares e Ipatinga, há 15 anos, Marcone lembra que ali descobriu a sua paixão. Desde então, fez excursões inesquecíveis, como para o Ushuaia, cidade da Argentina conhecida como o fim do mundo, e pela Transamazônica. “Sempre tenho um itinerário montado para servir de base, mas sequer faço reserva em hotéis, pois os imprevistos sempre acontecem e o plano muda de acordo com as circunstâncias”, disse o motociclista ao AcheiUSA. A verdade é que o mineiro, aos 37 anos, já coleciona muitos “causos” para contar. E ele incentiva as pessoas que corram em direção às suas ambições: “Se você deseja algo, busque esse sonho e faça acontecer. Não existe melhor motivação para a vida”, finalizou Marcone.