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Conheça os encantos e a riqueza cultural da cidade mais antiga dos Estados Unidos

St. Augustine é uma cidade que se alimenta de sua história e atrai milhares de turistas todos os anos

Fotos de Marcio Beck

Bastam poucas horas na I-95 (sentido Norte), para quem mora no Sul da Flórida embarcar em uma viagem ao passado longínquo. Mais especificamente, de 350 a 400 anos atrás, quando os ingleses ainda não haviam chegado, e os conquistadores espanhóis desembarcaram naquela faixa de terra habitada por nativos há cerca de três milênios. Localizada no atual condado de Saint Johns, a pequena St. Augustine revela em suas edificações, algumas sobreviventes da época em que as pedras de coquina eram a unidade básica de construção na região, os primórdios do que hoje são os Estados Unidos.

A “mais antiga ocupação contínua mantida por europeus na América do Norte” é uma cidade que se alimenta de sua história – literalmente, já que o turismo é ganha-pão de muitos ali. Para onde quer que se olhe, por onde quer que se ande, é impossível não topar com uma placa que revele uma construção, uma estátua, um acontecimento secular, um museu. Há construções e acontecimentos mais recentes, também bastante destacados, relacionados à modernização da Florida na virada do século XX, e ao movimento dos direitos civis na década de 1960.

É de se esperar, considerando que foi a capital da região até Talahassee. Não quer dizer que a visita a St. Augustine tenha que se resumir a uma longa e tediosa aula de história in loco típica dos passeios escolares, sem sombra de diversão para os adultos. Os restaurantes e bares reunidos no “centro antigo” da cidade podem ocupar confortavelmente as noites dos turistas, e, para os apreciadores, há ainda uma cervejaria, uma destilaria e um vinhedo disponíveis para visitação.

Mas não há como negar a vocação da cidade. Os mais nerds podem preferir criar seu roteiro histórico particular a partir de pesquisas online. Para os turistas casuais, há uma solução bem mais fácil: pagar o ingresso de um dos dois tours concorrentes que circulam pela cidade em “trens” com rodas, Old Town Trolley e Ripley’s Red Train. Os preços ficam em torno de $20, com descontos para famílias e grupos numerosos.

Pedro Menendez de Aviles
Pedro Menendez de Aviles

Ao longo de duas horas, ambos circulam pelos pontos mais importantes da cidade, fazendo paradas em pontos pré-determinados. Nestes, os visitantes podem saltar, observar o que quiserem observar, e aguardar alegremente o próximo “trem” para seguir a viagem. Em tese. Na prática, é possível, uma vez tendo saltado, que a pessoa ou o grupo tenham que esperar até 1 hora para aparecer um “trem” que não esteja lotado e possa acomodá-los para continuar o passeio. Seguem o mesmo esquema, basicamente, apesar das pequenas diferenças nos roteiros. Aparentam convivência saudável.

Uma das paradas obrigatórias do passeio é o Fountain of Youth Historic Archeological Park, que marca a chegada de Ponce de León à Pascua Florida e o estabelecimento da primeira colônia bem-sucedida na América do Norte, por Menendez de Avilés e sua expedição de 200 marinheiros, 500 soldados e 100 colonos de variadas profissões.

O caminho para a entrada do parque é coberto por árvores seculares dispostas ao longo da Magnolia Avenue, exemplo da beleza que se esconde na simplicidade. A menos de 200 metros dali, porém, “The Old Senator”, carvalho vivo há mais de 600 anos, é “testemunha silenciosa” da história de combates dos espanhóis com os franceses e ingleses. Diante da baía (apropriadamente) chamada de Matanzas, o Castillo de San Marcos reúne a memória destes confrontos, desde que começou a ser construído, em 1672, para proteger os habitantes dos ataques de piratas.

‘NOME DE DEUS’

Para os que professam a fé católica, a cidade reserva uma atração especial: o ponto onde o padre Francisco López de Mendoza Grajales, integrante da expedição de Menendez de Aviles, rezou a primeira missa no continente em 8 de setembro de 1565 – a quem interessar possa, um sábado. O local, 22 anos mais tarde, seria transformado na primeira missão da América, intitulada “Nombre de Diós” (Nome de Deus), com o objetivo de converter os nativos Timucuas.

Foi erigido ainda, em 1615, um templo rústico dedicado a Santa Maria, em sua faceta de Nuestra Señora de La Leche y Buen Parto (“Nossa Senhora do Leite e do Bom Parto”), construído inicialmente em 1677 pelo governador espanhol da região, e destruído duas vezes. Uma, por saqueadores ingleses, em 1702; outra, em 1728, pelos próprios espanhóis, para evitar que o local, novamente sitiado pelos ingleses, fosse usado pelos invasores.

Hoje, o espaço é marcado por uma estátua de bronze de Mendoza Grajales, o capelão de Jerez de La Frontera que se tornou, para todos os efeitos, o primeiro pastor a atuar em solo americano, e uma cruz metálica de cerca de 30 metros, erguida no 400º aniversário da cidade. Escavações feitas por técnicos da Universidade da Flórida a partir de 2001 levaram a descobertas importantes sobre os antecedentes da área – e levaram também a dezenas de novas perguntas.

VIDA MODERNA

Um dos artífices reconhecidos da transição do antigo território de disputa de espanhóis, franceses e ingleses para um estado moderno da república dos EUA com os olhos voltados para o turismo, Henry Flagler, deixou sua marca na cidade: o Hotel Ponce de León. Erguido em 1888, foi o primeiro de muitos que que o sócio-fundador da Standard Oil espalharia pela Florida. Atualmente, o antigo prédio do Ponce de León abriga parte do Flagler College, criado em sua homenagem.

O papel de St. Augustine na recente luta contra a segregação racial é lembrado também em diversos pontos. Um destes é a McCrory Five and Dime Store, na St. George Street, onde Henry “Hank” Thomas foi o único a ter coragem de aparecer um protesto. Acabou preso e quase foi mandado para uma instituição mental. Tornaria-se, mais tarde, um dos “Freedom Riders”, grupo de ativistas que circulava de ônibus organizando protestos e atos contra o racismo no Sul dos EUA. Tiroteios provocados pela Ku Klux Klan, protestos com o pastor Martin Luther King ao lado do dentista Robert Hayling, um dos líderes do movimento local, abalaram a cidade em 1964.

Hoje, os habitantes de St. Augustine vivem em paz com o passado. Mas não se esquecem dele de jeito nenhum.

Lighthouse
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