Alenizia Cruz Neff, apesar de já ter três processos aprovados, quase foi deportada pelo ICE
A intervenção do ativista dos Direitos Humanos, C. Shahel Freeman, e dos demais membros do Brazilian American Democratic Club, do condado de Palm Beach, no entanto, impediu que se consumasse uma tremenda injustiça contra uma pessoa que sempre foi uma cidadã correta, cumpridora dos deveres e entrou no país de maneira legal. “Até hoje tenho comigo minha I 94”, revelou Alenizia.
Mas como a situação chegou a este ponto tão dramático? Na verdade, isto é resultado de um conjunto de fatores que conspiraram contra ela, tais como negligência do ex-esposo, mau trabalho de advogados de imigração e intransigência de funcionários do Serviço de Imigração dos EUA.
Sucessão de desencontros
O caso é mesmo muito complicado. Para facilitar aos leitores, o melhor é deixar que a própria Alenizia conte sua trajetória nos EUA, desde sua chegada ao país em novembro de 1989: “Cheguei aqui junto com meu então marido e uma filha de cinco anos de idade, desembarcando no Aeroporto Internacional de Miami. Viemos porque meu marido foi convidado a ser vice-presidente da Igreja Evangélica Brasileira, localizada em Margate, e comandada pelo pastor Abraão de Almeida”.
Na ocasião, a igreja aprovou o casal e eles foram autorizados a se legalizarem pela instituição religiosa. O ex-marido de Alenizia na época procurou um advogado cubano-americano que o convenceu a entrar com um pedido de legalização requerendo asilo político. O casal retrucou, mas o advogado sustentou que esta seria a melhor opção.
Foi, no entanto, um aconselhamento errado. Os brasileiros não têm motivos para solicitar asilo político porque o Brasil é um regime democrático e não se enquadra, portanto, neste figurino. Tentou-se então anular este processo, mas o juiz de imigração não concordou e manteve sua decisão.
Começou o calvário da família Cruz. O ex-marido de Alenizia recebeu uma carta para comparecer à Corte, foi ao encontro mas não notificou a mulher e as filhas – a mais nova nasceu aqui nos EUA. Neste interim, eles foram comunicados de que o processo de imigração feito através da igreja havia sido aprovado.Tanto que receberam autorizações de trabalho e documentos para tirar as carteiras de motorista.
Em 2001, a irmã de Alenizia entrou com um processo em seu benefício, uma vez que ela é cidadã americana.”No dia 10 de julho de 2008, recebi a notícia de que este processo havia sido aprovado”, disse a valadarense. Entretanto, logo a alegria deu lugar à frustração: “O USCIS me informou que os processos familiares estavam demorados e eu teria de esperar 14 anos para receber meus documentos”.
História de decepções e lutas
Voltando um pouco no tempo, ela contou que a família comprou uma casa em Fort Myers e mudou-se para esta cidade do Golfo do México, em 1999. Lá, ela abriu uma empresa de limpeza de casas e pintura em sociedade com o ex-marido. “Cheguei a ter mais de 40 funcionários”, lembrou, com uma ponta de orgulho.
O mundo dela, todavia, ruiu em 2006. O então marido, que já havia dado mostras de ser infiel, decidiu assumir oficialmente a amante e o casamento acabou. Em consequência, a empresa também foi tragada pelo mau relacionamento entre os sócios e a pá de cal veio definitivamente com a crise econômica do país.
Talvez cansado da vida dupla e envergonhado por seus atos, o ex-marido resolveu voltar para o Brasil, desta vez casado com outra mulher. Alenizia, porém, ficou aqui, cuidando das duas filhas e lutando para manter a família. Em 2007, a convite de alguns amigos, foi morar em Atlanta.
Finalmente, em abril de 2009, ela se mudou para Fort Lauderdale para administrar o schedule de limpeza da irmã que precisou ir ao Brasil fazer uma cirurgia. A mudança foi radical na vida de Alenizia. Um mês depois de estar morando no condado de Broward, conheceu Timothy Neff, pastor evangélico e veterano da Guerra do Vietnã. Foi amor à primeira vista, tanto que em setembro do mesmo ano eles se tornaram marido e mulher.
Cenas de um filme de suspense
Naturalmente, como esposa de um cidadão americano, ela deu entrada nos papéis para obter seu visto de residente permanente no país. Os dois foram para a entrevista e tiveram o I 130 aprovado, ou seja, o casamento foi considerado pelo USCIS como de boa fé.
A entrevista foi realizada no dia 3 de outubro deste ano e serviria para homologar a união do casal perante o Serviço de Imigração a fim de Alenizia conseguir finalmente seu green card. Entretanto, o roteiro não seguiu o enredo principal. “Durante a entrevista, o oficial de Imigração me perguntou se eu havia deixado o país em 2006, porque em sua ficha constava que eu fui para o Brasil em 22 de agosto de 2006. Por três vezes, respondi que não, a informação era incorreta”, explicou a mineira.
O funcionário, porém, saiu da sala e retornou com duas pessoas: uma supervisora e um agente do ICE (a polícia da Imigração). “No momento de trocarmos um aperto de mão, o agente do ICE me disse: ‘Sabe que eu posso te levar presa agora?’ Mas ele não fez isto e me instruiu a comparecer a um departamento da Imigração em Stuart. De lá, eles me reencaminharam para outra unidade em Delray Beach”, contou Alenizia.
Lá, a funcionária colocou a brasileira em uma sala e mostrou um vídeo.”Após a exibição, ela pediu meu passaporte, colocou uma tornozeleira eletrônica na minha perna e disse que eu teria de comprar uma passagem de ida para o Brasil, porque eu estaria voltando entre os dias 5 e 8 de dezembro”, revelou Alenizia.
Gasto e ajuda
A fim de corrigir a injustiça, o casal Neff contratou um advogado e pagou taxas para o Serviço de Imigração, totalizando gastos que somaram $ 15,000, dos quais $ 3,000 foram destinados ao advogado. O advogado foi rápido para embolsar o dinheiro, mas lento para tomar atitude. Em vez de tomar as providências, protelou as ações. Desesperada, Alenizia ligou várias vezes e ouvia apenas que o escritório estava lotado de casos urgentes e não podia dar assistência a ela.
Foi, então, que entrou em cena o Brazilian American Democratic Club. Em um email enviado para Isabel Santos, presidente do clube, Alenizia narrou sua desdita. Condoída, Isabel acionou seus companheiros e C. Shahel Freeman, ativista de Direitos Humanos, resolveu entrar em ação.
Freeman comentou ter ligado diretamente para o advogado e ele se mexeu, enviando um comunicado para o ICE. Alenizia pediu que a assistente do escritório entrasse em contato com o agente do ICE responsável pelo caso dela. Como não recebeu resposta, ela mesma tomou a inciativa de telefonar. No momento em que estava conversando com o funcionário do ICE ” segundo Alenizia, “um sujeito bem legal”-, ouviu a assistente falando com ele sobre o assunto.
Apesar da pressão, Freeman é categórico: “Eles não têm base para mandá-la de volta ao Brasil e têm de recuar”. Ele aproveitou para destacar a necessidade de os brasileiros se organizarem para lutar por seus direitos, porque somente assim é possível fazer a diferença dentro do processo político americano.
Ele foi secundado por Isabel Santos e por Robin Blanchard, diretora do Brazilian American Democratic Club, que garantiram: “Esta questão imigratória não é culpa de Obama. Ele quer fazer a coisa certa, mas está com as mãos atadas por causa da intransigência dos republicanos”.
Na opinião delas, apenas uma adesão significativa dos brasileiros pode mudar esta situação. Para isto, conclamam os brasileiros (documentados ou indocumentados) a se filiarem ao clube. Quem quiser saber mais informações sobre como participar, pode enviar um email para brasibel13@hotmail.com. Ou então ir à reunião do clube, marcada para o dia 8 de dezembro no Restaurante Brasil, em Boca Raton, a partir das 7h30 da noite.