Quando eu mergulhava no veleiro do meu amigo Tony McCleery, eu que preparava nossas refeições, como parte do “pagamento” pela estadia. Geralmente levava alguns mantimentos de Miami ou mesmo do Brasil, e nos primeiros dias atracávamos em algum porto onde houvesse um mercado perto para comprar carnes e legumes. Ele construiu o veleiro no começo dos anos 90, e comecei a mergulhar com ele em 2005. Os temperos que ele tinha na cozinha ficavam em um pequeno armário – e eram de quando o barco foi construído. Alguns dos temperos haviam fossilizado dentro dos vidros, outros ainda se moviam um pouco – sem saber se eram especiarias soltas ou insetos dentro, eu nunca os usava…
Ele tinha compartimentos espalhados pelo veleiro todo, onde guardava mantimentos, ferramentas e utensílios. Em um deles, ele tinha diversas latas de refrigerantes – eu gosto de água tônica, e um dia ele tirou uma lata de lá e me deu para beber durante o almoço. Achei que estava com gosto meio estranho, meio metálico, fui ver a validade: “válido até agosto de 1997”.
Ele me contou uma história de quando resolveu comer em um restaurante meia-boca em um ilhote, e serviram peixe estragado. Perguntei se ele foi para um pronto-socorro quando percebeu que estava com intoxicação alimentar, sua resposta foi “não, eu me arrastei pelo cais até chegar ao meu barco, e me deitei”. Ou seja, ele sobreviveria a qualquer tipo de gororoba que eu fizesse…
Além do mais, o Tony é britânico, então digamos que seu paladar não é dos mais refinados. Fiz oito viagens de mergulho com ele, Antigua e Barbuda (Caribe), Bahamas, Honduras, Costa Rica, Panamá, Colômbia, Curaçao e a última em St. Vincent (Caribe). Na primeira viagem eu não sabia exatamente o que ele comeria – acabei descobrindo logo que ele gostava de qualquer coisa, contanto que não tivesse que fazer.
Um dos quebra-galhos de almoço que eu fiz a primeira vez se tornou um dos pratos preferidos dele: sanduíche de atum com maionese e cebola. Ele gostou tanto que na segunda viagem ele tinha comprado dezenas de latas de atum, e me confessou que comia aquilo quase todo dia. Mas eu tive que ampliar meus dotes culinários, até arroz eu fiz (e nunca havia feito na vida).
Eu me lembrei disso tudo porque há uns dias eu fui fazer um patê com um vidro de aliche que trouxe de Miami para São Paulo. Na realidade eu havia comprado na Itália e levei para Miami para minha mãe, mas ela acabou não comendo e eu trouxe para o Brasil. Quando fui guardar na despensa, notei que havia vazado óleo, então decidi colocar na geladeira, provavelmente a pressão do avião fez entrar ar. E eu deixei lá por uns dias. Comi um pouco uma noite, e achei meio estranho – “nah, vai ver que é o tempero que coloquei junto”, pensei. Depois de uns três dias fui comer o resto com uma fatia de pão – foi fácil espalhar, ele estava quase dissolvendo!
Mái Gódi… naquela noite eu quase virei do avesso. No dia seguinte também. No outro também… Eu não percebi na hora que tinha sido o aliche – eu ia fazer uns exames de sangue e um ultrassom abdominal porque minha endocrinologista havia pedido. Ela me disse que umas dores que sinto de vez em quando poderia ser pancreatite – ela sabe que me alimento mal e bebo de “vez em quando”, fatores que podem causar esse problema.
E obviamente que o Marquinhos aqui foi olhar o Dr. Google. Vixe, me ferrei! Se eu quiser me curar não poderei mais comer comidas muito gordurosas, nem beber álcool!!!! Eu sabia, exagerei no vinho. E na cerveja. E na tequila. Será que devo aumentar o valor do meu seguro para a Bianca? Ou falar com meu advogado para passar o apartamento para ela? Cadê meu violino para fazer fundo musical???
Bom, fiz os exames e tudo está 100%, até o colesterol está normal mesmo comendo as tranqueiras que como – ao ler os resultados foi quando me toquei que o que me fez mal foi o maledeto aliche. Ufa!