O recifense Glauberto Wanderley, 72, reside em Danbury desde 1996. Da sua cama de hospital, onde se encontra internado desde o dia 29 de maio para tratamento da Covid-19, ele faz um difícil relato dos 37 dias que passou na UTI respirando com a ajuda de oxigênio. Apesar de não ter sido colocado no respirador artificial, para Wanderley a luta para se livrar da doença tem sido a pior experiência que já passou até hoje. “Já sofri de tudo nesta vida. Fiz três pontes de safena, tive um pulmão colapsado, sou diabético, e mesmo assim enfrentar este vírus tem sido terrível”, relata ele que agora se encontra em um quarto intermediário, chamado de nível 2, para os pacientes que são liberados da Unidade de Tratamento Intensivo, mas que ainda requerem cuidados especiais.
Wanderley não está sozinho. Somente no estado de Connecticut, até o fechamento desta edição, são mais de 47 mil casos confirmados e 4500 mortes pelo novo Coronavírus. Mesmo com os números controlados, o governo do estado adiou a fase 3 da reabertura do comércio prevista para ocorrer esta semana. Um plano para a volta das aulas do ano letivo de 2021/2022 foi anunciado para entrar em vigor no outono.
Entretanto, um relatório do CDC (Center for Disease Control and Prevention) do Governo Federal mostrou que o número de pessoas que tiveram contato com o vírus pode ser pelo menos seis vezes maior, o que coloca Connecticut com uma estimativa de 282,000 pessoas infectadas desde o início de maio. O levantamento, que foi feito pela primeira vez pelo órgão, aponta que perto de 5 por cento dos residentes do estado já possuem anticorpos contra o Covid-19. Connecticut é o segundo estado com maior número de pessoas que foram expostas ao Coronavírus, ficando atrás apenas de Nova York com 7 por cento da população.
Virologistas e outros profissionais da saúde estão apreensivos com a ideia de relaxar as medidas de segurança, abrir parte do comércio e retomar as aulas. Eles afirmam que isso pode trazer uma segunda onda do vírus, transmitida principalmente nos locais de trabalho e nas salas de aula.
Sem qualquer doença prévia, Valdivino Passos, 62, está entre os brasileiros que acredita ter se contaminado no trabalho. Motorista de passageiros para aeroportos, ele se viu entregando pizza depois da paralisação das suas atividades devido à pandemia no dia 22 de março. “Ninguém estava acreditando que poderia pegar o vírus. Na cozinha da pizzaria ninguém usava máscaras”, relata ele. Metade dos funcionários acabou testando positivo para o coronavírus.
A confirmação de que estava de fato contaminado ocorreu no dia 20 de maio quando foi internado no Bridgeport Hospital, 11 dias após o início dos sintomas. “Eu não pensava que estaria contaminado, por isso não fui ao médico antes”, diz. Se ele fosse assintomático, Valdivino estaria entre a parcela da população que não chegou a ser internada por desconhecer a presença do vírus.
Não foi exatamente o caso dele. Mesmo não tendo sintomas graves da doença, Valdivino precisou ficar dois dias internado para ser medicado. Neste período, ele chegou a pensar que não iria sobreviver. O motivo não foram os efeitos causados pelo vírus, mas o estado psicológico. “A minha referência naquele momento era de que o vírus matava. Por isso eu pensava o tempo todo que iria morrer. Cheguei a me conformar com isso. Acho que a fé que tenho ajudou a superar”, explica ele completando que “foi uma experiência muito ruim”.
Latinos em geral entre os mais atingidos
Por todo o país os números refletem um mesmo padrão. Negros e latinos são dois dos grupos minoritários mais suscetíveis a serem contaminados e morrerem. Os dados são alarmantes segundo especialistas que acompanham a evolução da pandemia. Brasileiros, e latino de uma forma geral, são hospitalizados numa proporção 4 vezes maior do que brancos. Já os negros são 5 vezes mais.
Rogelio Saenz, um professor de Política Comunitária de Saúde, da Universidade do Texas em San Antonio College, vem estudando as taxas de mortalidade e infecção dos latinos desde o início da pandemia. No seu último relatório, Saenz notou que os latinos são agora o maior grupo que contraiu o vírus nos 43 dos 44 estados que fornece informação de raça.
Nem o fato da comunidade latina e negra ser mais jovem, apresentar melhores condições de saúde, portanto, estarem fora do grupo de maior risco da Covid-19, tem evitado que eles entrem nas estatísticas mais do que os idosos brancos que compõem grande parte da população. “De uma forma geral, estamos sucumbindo para esta doença em uma taxa de cerca de 2 a 2,5 vezes mais alta do que a população branca”, disse Saenz. “No caso a população negra, a situação é ainda pior de 3 a 3,5 vezes maior”.
A recomendação dos especialistas no mundo todo para combater a doença e evitar a contaminação permanece a mesma. Usar máscaras e praticar o isolamento social. O alerta fica mais enfático quando vindo da cama de hospital de Wanderley. “Eu também pensava que estava protegido somente usando máscaras. O risco existe. Ou vocês se responsabilizam pelo que fazem ou irão sentir a dor de passar o que estou passando”, alerta.