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Coronavírus: um brasileiro na Itália – NÃO é só uma gripe

O colunista do AcheiUSA, Marcus Coltro, relata a situação que os italianos e moradores da Itália - como ele - estão vivendo com a pandemia do coronavírus

Ilustração: Marcus Coltro

As redes sociais estão enchendo as páginas com diversas informações desencontradas sobre o coronavirus na Itália e no resto do planeta. Aliás, muitos que criticaram a Itália a estão seguindo em atitudes consideradas “exageradas e extremas”, como o fechamento de escolas e locais públicos. Não dá nem para colocar os números de doentes no texto, estão aumentando progressivamente a cada minuto.

Na região em que moro, a Ligúria, havia poucos casos até recentemente e até nos sentíamos seguros. Mas a velocidade com que o vírus se propaga nos fez mudar os hábitos pessoais, como evitar de sair de casa e frequentar ambientes fechados. Admito que no começo também achei um pouco exagerado tudo isso, mas o número de infectados cresceu tão rápido que percebi que não era brincadeira.

Os médicos estão tendo que tomar a pior decisão de suas carreiras: quem deve viver e quem fica sem ajuda, sejam idosos ou não. Chegará uma hora que somente haverá um respirador disponível e várias pessoas de todas as idades na fila. Simplesmente não há leitos suficientes para tanta gente – e não pense que cidades como São Paulo (que tem a maior rede de hospitais do país) teriam condições de absorver uma pandemia deste tipo. Chegaria uma hora que acabariam os leitos e os médicos ficariam sem saber o que fazer. Os médicos e enfermeiros daqui já estão fazendo turnos extensos – não sei até quando aguentarão, mas estão lutando bravamente.

O vírus tem sobrevida longa em superfícies metálicas e sólidas, basta um espirro de um doente em um corrimão que muitas pessoas se contaminam e levam para casa, onde pessoas do grupo de risco podem ficar doentes e até morrer. Li que dependendo das condições o vírus fica no ar por vários minutos. Imaginem meia dúzia de infectados andando de metrô em São Paulo na hora do rush? Quantos levariam para casa esse “presente” e repassariam para toda a família? Vejo postagens no Facebook no estilo “ah, só tem 3 ou 4 infectados no meu estado, por que fechar as escolas?”. Pois é, foi UMA pessoa infectada que trouxe o vírus para a Itália e passou para muitos outros em questão de dias.

Então, na semana passada o governo italiano radicalizou como nenhum outro país já fez para impedir a propagação de uma doença, ordenou o fechamento de restaurantes, lojas e locais públicos por 15 dias – o período de incubação do vírus. Sugeriu às empresas dar férias coletivas e para quem pudesse que trabalhasse de casa, só saindo para comprar mantimentos. E durante o fim de semana o mesmo foi aplicado em outros países (que até sexta-feira estavam seguindo a linha de pensamento dos brasileiros) – o pânico criou correrias aos supermercados. Aqui a situação criou o mesmo problemas nos primeiros dias em alguns lugares, mas na maior parte os supermercados já voltaram ao normal – só falta álcool gel e máscara, e não tivemos ataques às prateleiras de papel higiênico (temos bidê…).

Somente indústrias, pequenas empresas e escritórios que não recebem clientes podem continuar trabalhando – o que é o caso da minha empresa. A vida mudou radicalmente, as pessoas evitam de se cumprimentar e até mesmo de sair de casa. E se tiver que sair, tem que apresentar um motivo plausível – tive que imprimir declarações de trabalho para meus funcionários carregarem consigo, e meu irmão e eu carregamos os documentos da empresa. Recebi uma mensagem da minha contadora dizendo que este mês não teríamos que pagar os impostos. Supermercados podem ficar abertos até às 18 horas, mas somente um membro da família pode fazer as compras de cada vez e ninguém pode ficar menos de um metro de distância dos outros lá dentro.

As caixas do supermercado (que trabalham de luvas e máscaras) só atendem um novo cliente após a saída do primeiro das proximidades, e a cada hora têm que higienizar todo o local com sprays desinfetantes. Na sexta-feira instalaram placas acrílicas entre os caixas e os clientes. Em farmácias já existia uma máquina para receber e dar o troco em dinheiro, evitando assim o contato do atendente com notas e moedas (grandes transmissores do vírus e de outras doenças). A polícia está agindo de forma enérgica para coibir quem quer que seja que tente furar o toque de recolher, multam e inclusive têm ordem de prender quem resistir.

Enquanto no mundo os casos só crescem, na Itália estão diminuindo aos poucos. Codogno na Lombardia foi o epicentro da doença, e  no dia 12 de março já não havia casos novos da doença. Só que todo esse trabalho e agrura que o país passa pode ir pelo ralo se os outros países não agirem com firmeza e seriedade, o vírus pode voltar a infectar locais que já estavam seguros antes que consigam encontrar uma vacina.

Aparentemente o brasileiro ainda não percebeu a gravidade: “Morre mais gente de tuberculose, de dengue, disso, daquilo, só morrem os mais velhos e doentes”. Ok, e se o “mais velho ou doente” for um ente querido da sua família, e VOCÊ que o infectou? Pense nisso antes de ir para a balada com os amigos e ficar desdenhando nas redes sociais o perigo que ronda todos nós.

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