Eles não estão nas ruas, trocando sopapos, juram que quase nunca se metem em encrencas e dizem que não são violentos. A fama de bad boy que acompanha quem pratica o esporte que eles escolheram como profissão é indevida, segundo afirmam, e só é aplicável àqueles que “passaram” por academias e “se dizem” lutadores. Eu estou falando dos brasileiros que lutam jiu-jitsu, na Flórida, e que se auto apresentam como “atletas”, que praticam o esporte por prazer e paixão. Vão além: dizem que jiu-jitsu é uma “arte”!
Uma primeira olhada neles já deixa claro que não se encaixam no estereótipo alimentado pela imaginação popular. Eles não são “bombados” (inflados por anabolizantes), têm estatura média e, se não disserem, jamais serão apontados como lutadores. Alimentam a vontade de serem considerados mais esportistas que lutadores e alguns sobrevivem só lutando.
Um exemplo é o carioca Edson Diniz, 25 anos, dez de prática de jiu-jitsu e vale-tudo, e que acabou de vencer um campeonato mundial de vale-tudo, além de já ter ganhado vários títulos de jiu-jitsu – bi-campeão panamericano, campeão e vice-campeão mundial, bicampeão da Flórida, além de mais de 50 títulos no Brasil. Foi através de um campeonato que ele veio aos Estados Unidos, em 2000, quando participou do Panamericano de Jiu Jitsu, do qual foi vice-campeão. Não venceu e resolveu ficar no país. Não teve vida de imigrante – “só lavei pratos em Miami, por três dias, mas queria mesmo era ensinar jiu-jitsu”, diz- e logo ganhou uma chance de dar aulas particulares. Foi evoluindo e hoje é conhecido na região, dando aulas para brasileiros, hispânicos e americanos.
A fama de violento? “É natural, porque muita gente pratica o esporte. Então quando acontece uma briga, normal, na noite, é comum que tenha algum praticante de jiu jitsu no meio da confusão”, justifica Edson, que garante que no Brasil o problema é ainda pior, já que 90% dos jovens- afirma ele- são adeptos da arte.
Abraços
“E no jiu-jitsu você não aprende a brigar. O esporte é uma arte de queda, não de chutes e socos”, defende ele. Quem observar por alguns minutos um treino do grupo até concorda. Mais parece um bando de rapazes “se abraçando”. Aliás, eles admitem que sempre que ouvem gracinhas a respeito desses “abraços”.
Para quem pensa que tudo não passa de discurso público para os lutadores parecerem bonzinhos, dois detalhes: ele é evangélico e não passa dos 155 lb. Diante de um jovem nada “inflado” é difícil acreditar que ele seja lutador. Mas é. E consegue sobreviver do dinheiro que ganha com a profissão.
Campeão da agilidade
Quem também surpreende, fisicamente, é o aluno de Edson, Igor Felipe Troyack Dantas, 22, um tipo magrelo que concorre na categoria de até 150 lb. Ele mesmo admite que não corresponde ao estereótipo. “Tenho certeza que você esperava um tipo grandão”, brinca ele com a reportagem, dizendo que ganha mais com sua agilidade do que com o físico.
Igor venceu o campeonato NAGA – North American Grappling Association, maior do mundo na categoria, no dia 22 de junho, e ainda não contém a felicidade. Acha que está no caminho de ser um grande atleta e sobre a má fama da luta tem um argumento irrefutável: “eu até fiquei mais disciplinado depois que comecei a praticar. Eu aprendi a regular meus horários, deixei de beber e sair com frequência, como fazia. Também ganhei auto-confiança e aprendi a não subestimar ninguém”.
A explicação é uma tentativa de esclarecer que a luta, quando encarada como esporte, influencia positivamente a vida dos lutadores.
“Quem usa a luta para sair por aí brigando não é lutador de verdade. Eles só estão sujando a imagem de muita gente que está aqui porque gosta do esporte. Muitos deles só ‘passaram’ por uma academia, compraram uma camiseta em qualquer loja onde está escrito jiu-jitsu, ‘pensam’ que são lutadores e saem por aí fazendo bagunça”, diz Igor.
“Quem é lutador de verdade não tem tempo para sair brigando. A gente só tem tempo para treinar e se dedicar ao esporte”, completa Edson, que se divide entre as lutas – hoje mais dedicado ao vale-tudo-, a igreja, a esposa e uma filhinha de 2 meses.
Dura rotina
E a rotina deles não é fácil. Acordar cedo, treinar, trabalhar, treinar, dormir, acordar… No caso de Edson o trabalho é dar aulas na sua academia. No caso de Igor o trabalho é como delivery boy. “Minha rotina é essa. Acordo, treino por duas horas, vou trabalhar às 11h30, depois sigo para academia para ‘pegar peso’, volto para o trabalho no final da tarde e fico até as 21h30 ou 22h. Então eu vou treinar outra vez”, conta Igor.
Com Edson não é diferente. Ele chega a ter que queimar, antes de lutar, 7lb em 40 minutos -o que consegue- para se encaixar na sua categoria. Um esforço que traduz a disciplina de quem quer se profissionalizar. E no aspecto físico, um detalhe: muitos campeonatos não aceitam quem usa anabolizantes.
Ainda sobre a violência do esporte, ele garante: “se você for no Maracanã, em um jogo de futebol, você só vê violência. E não é entre lutadores de jiu-jitsu. A violência está na pessoa. Se você tem má índole não é o esporte que vai te influenciar”.