Após reunir-se em Amã (capital da Jordânia) com o premiê iraquiano Nouri al Maliki, o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, descartou nesta quinta-feira a retirada das tropas americanas do Iraque enquanto reafirmou seu apoio ao líder xiita. Ontem, um memorando elaborado pelo conselheiro de segurança dos EUA, Stephen Hadley, questionou habilidade de Al Maliki para conter a violência sectária no país.
Bush tentou esvaziar a força da crescente pressão pela retira dos mais de 140 mil soldados americanos do Iraque, reenergizada pela vitória dos democratas nas eleições legislativas americanas deste mês.
Mas não são apenas adversários que recomendam a retirada das tropas –o Grupo de Estudos para o Iraque, comitê bipartidário encarregado de elaborar estratégias para o governo, recomendará expressamente uma retirada gradual a partir de 2007, segundo uma reportagem divulgada hoje no jornal “The New York Times”.
Apesar da especulação, o presidente reafirmou sua intenção de permanecer no Iraque até que “a missão esteja concluída”. “Esse negócio de retirada graciosa simplesmente não é realista”, afirmou hoje em Amã.
Mesmo sendo conhecido por agir sem aviso prévio, como no caso da renúncia do secretário de Defesa americano, Donald Rumsfeld, os comentários de Bush depois da reunião em Amã parecem fixar alguns pontos sobre os quais ele não aceitará ser pressionado.
Esse pontos incluem a recusa em iniciar uma retirada significativa de tropas, em dividir o país em regiões autônomas e em negociar diretamente com a Síria e o Irã para incluir os países vizinhos no esforço de estabilização do Iraque.
Nouri al Maliki
A reunião de hoje também foi utilizada para expressar o apoio de Bush a Nouri al Maliki. A declaração de apoio veio após a divulgação do memorando da Casa Branca no qual o conselheiro de segurança nacional questionou se o premiê tem a competência ou a vontade para coibir a violência no país.
Oficiais americanos insistiram que Al Maliki não se ofendeu pelo memorando, apesar de o premiê não ter comparecido a uma reunião com Bush marcada para ontem.
“Ele é o cara certo para o Iraque e nós vamos ajudá-lo. É de nosso interesse ajudá-lo”, disse Bush em uma entrevista coletiva, ao lado de Maliki, hoje na capital jordaniana. “É de nosso interesse ajudar a liberdade a prevalecer no Oriente Médio, começando pelo Iraque.”
Além de reassegurar a posição do premiê, Bush afirmou a jornalistas que ele e Al Maliki concordavam que um plano de dividir o Iraque em regiões autônomas só serviria para fomentar a violência sectária no país. Os dois líderes falaram à imprensa após um café da manhã de negócios e um encontro em particular.
Três Iraques
“O premiê já deixou claro que dividir seu país em partes, como alguns sugerem, não é o que o povo iraquiano deseja e que qualquer divisão levará a um aumento na violência sectária. E eu concordo”, afirmou Bush.
Nos EUA, aumentam os debates sobre a necessidade de uma partilha do Iraque, em parte para justificar uma saída dos americanos da guerra.
As vozes mais proeminentes que defendem uma separação do Iraque são o senador democrata Joe Biden e o presidente emérito do influente Council on Foreign Relations, Leslie Gelb. Eles atuam juntos e lançaram sua proposta para que o Iraque seja dividido em três regiões autônomas (xiita, sunita e curda), cada uma responsável por suas leis domésticas e segurança interna.
De acordo com este plano, o governo central zelaria pela defesa das fronteiras, relações internacionais e a alocação das divisas de petróleo (carente na região sunita). Bagdá, a capital multisectária e ultraviolenta, se tornaria uma zona federal.
Mudanças
Segundo Bush, ele e Al Maliki conversaram por aproximadamente duas horas na manhã de hoje –tanto em particular quanto na presença de assistentes– para explorar as possíveis mudanças em estratégias que poderiam aumentar a habilidade do governo iraquiano em coibir as milícias.
As discussões foram produtivas, de acordo com funcionários da Casa Branca. O principal foco foi a aceleração do treinamento das forças de segurança iraquianas e a transferência da responsabilidade sobre a segurança para os oficiais iraquianos. Membros do Exército americano, no entanto, afirmaram temer que essa transferência estimule as forças iraquianas a agir como milícias, a não ser que a supervisão internacional continue.
“Não é fácil desenvolver um Exército do zero”, disse Bush sobre os esforços de Al Maliki de construir forças iraquianas. O presidente admitiu que o premiê está “frustrado com o ritmo” desse esforço.
Outras recomendações
As declarações do presidente chegaram após se tornar público que o Grupo de Estudos para o Iraque recomendará que os militares dos EUA saiam da linha de frente de combate e passem a colaborar dando apoio para tropas iraquianas.
O grupo deverá também recomendar que os EUA aceitem negociar a inclusão do Irã e da Síria no esforço de estabilização do Iraque. Até agora, Bush rejeitou negociar incondicionalmente com os dois países, que acusa de fomentarem a violência nos países vizinhos.
Por sua vez, Al Maliki disse que quer manter boas relações com seus vizinhos, mas que teme a interferência estrangeira no Iraque. “O Iraque é para os iraquianos. Suas fronteiras são defendidas e não permitiremos que sejam violadas, ou que interfiram em nossos assuntos domésticos”, disse o líder.
O Grupo de Estudos para o Iraque está previsto para apresentar suas recomendações ao governo em 6 de dezembro.
Na Jordânia
Após os encontros, Bush deixou Amã.
Esperava-se que Bush e Al Maliki se reuniriam ontem com o rei da Jordânia, Abdullah. Durante a viagem da Letônia para a Jordânia, no entanto, Bush foi avisado que os jordanianos e iraquianos decidiram não realizar o encontro a três. O rei Abdullah acabou se encontrando com Bush e Al Maliki separadamente, segundo um oficial americano.
Bush sofre atualmente intensa pressão interna e externamente para mudar sua estratégia para o Iraque, onde a violência sectária não mostra sinais de diminuição, apesar da recusa da Casa Branca em classificar a situação como uma guerra civil.
Em Dubai (Emirados Árabes Unidos), um grupo militante iraquiano chamou hoje seus seguidores sunitas para empreenderem uma “guerra santa” contra as milícias xiitas. “Bagdá é nossa cidade. Não a deixe para estranhos que querem nos expulsar. É uma batalha do destino agora”, afirmou o grupo em um site islâmico na internet.
O grupo, que já assumiu a responsabilidade por diversos ataques em tropas americanas no Iraque e pelo seqüestro de vários estrangeiros, havia até então limitado seu chamado à guerra contra forças estrangeiras.